quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Foi apenas um sonho

O lado frio da infelicidade


Camila Vieira*

Com Foi Apenas um Sonho, Sam Mendes retoma o mesmo projeto de Beleza Americana (1999): fazer uma crítica ácida ao american way of life, ao estilo de vida norte-americano que vende uma promessa de bem-estar, mas não passa de puro conformismo. Inspirado no romance Revolutionary Road (1961), de Richard Yates, o filme narra a trajetória do casal Wheeler, Frank (Leonardo di Caprio) e April (Kate Winslet), que procura fugir desta apatia, mas que acaba sucubindo ao peso de constituir uma família, morar no subúrbio, manter o emprego por pura necessidade, ou seja, viver o "sonho americano" que, se a princípio parece promissor, acaba proporcionando infelicidade.

No filme de estréia de Sam Mendes como diretor de longas-metragens - Beleza Americana -, o retrato deste universo hipócrita da sociedade rica norte-americana é construído com o auxilio de uma complexa ironia tanto visual quanto verbal, a ponto de provocar certo riso constrangedor ou uma sensação de cinismo que acompanha os personagens.

Em Foi Apenas um Sonho, o mesmo não acontece. Não há espaço para riso. O tom é sério, o pessimismo é generalizado, a atmosfera é depressiva, o desenvolvimento da trama é claustrofóbico, os personagens se sufocam... Há tanto peso e densidade, que muitas cenas são insuportáveis. Não é um filme fácil de assistir.Por outro lado, algo soa falso, teatralizado em excesso, talvez impostado demais ou rigorosamente planejado. É como se Sam Mendes observasse o drama dos personagens de longe, de maneira fria, sem se envolver e permitir ao espectador que ele se envolva. Quer ser grave e extremo, mas destoa de um plano a outro.

O filme marca o reencontro de Leonardo di Caprio e Kate Winslet - ganhadora do Globo de Ouro 2009 de Melhor Atriz de Drama - nos cinemas, após Titanic. Estão amadurecidos, mas nada se compara à interpretação marcante de Michael Shannon - que recebeu indicação ao Oscar 2009 de Melhor Ator Coadjuvante -, no papel de um vizinho louco que o tempo todo joga a "verdade" na cara do casal.Foi Apenas um Sonho nem mesmo começou bem sua campanha rumo ao Oscar. Os principais prêmios anteriores - Critics Choice, associação de criticos de Nova York e Los Angeles e o National Board of Review - o ignoraram. Só levou três indicações ao Oscar 2009: a de Shannon, de figurino e de direção de arte. Resta saber se vai levar algum ou sair de mãos abanando.

* Camila Vieira é jornalista e mestranda em comunicação.

8 Comentários

Paula Crespo disse...

Apesar de ser um filme muito denso não o achei pesado. Acho mesmo que é um sinal de mestria, de como este filme está bem feito. Tive oportunidade de escrever mais sobre ele no post http://umaespeciedemim.blogspot.com/2009/02/inconformismos.html

Lisandro Nogueira disse...

Olá Paula,
Certamente é um filme denso. É curioso como o cinema americano se aproxima da seriedade quando as crises chegam; geralmente eles reportam a outros momentos da história. Quando via "Foi apenas um sonho", me lembrei de "O homem que não estava lá", do Irmãos Coen. Um filme sobre a ambição desmedida. Nesse filme, tb. denso, as situações dramáticas são trabalhadas sem um certo excesso na interpretação. Leonardo e Kate estão bem. Porém, com momentos "over" na interpretação. Bom, Paula, mais uma amiga em Portugal. Abraços, Lisandro.

Camila Vieira disse...

Concordo com vc, Lisandro, em relação às interpretações de Winslet e Di Caprio. Mas sobre o mesmo tema prefiro Little Children, tb com a Kate.

Lisandro Nogueira disse...

Olá Camila,
gosto do Litte Children. Alguns psicanalistas consideram o filme tb. muito bom. Mas aquele preto e branco do "Homem que não estava lá" é quase perfeito; além das interpretações e a presença ainda incipiente da Scarlet (a divã do Woody Allen).

Anônimo disse...

Denso!?
Para ser sincero não gosto do Dicaprio muito menos da Winslet. São belezas de um olhar domesticado. Enquanto crítica ao 'american live' o filme está longe. Lembrei-me do filme O Homem Sem Passado, o papel da moral, dos bons constumes e da memória. A ética é coisa do futuro.
Abraço
Thomas Silva

Anônimo disse...

Essa negocio de q o ator ta over e conversa de especialista agente que agente o publico e q o ator faz dum jeito q a gente pode entende. senao tem exagero quem q entende so especialista alguem faz filme pa especialista cinema precisa da lucro senao todomundo vai fica na praia vendo navio

Marco A. Vigario disse...

Olha, vi esse filme ontem e gostei muito. Tem cenas problemáticas? Tem (DiCaprio correndo pela rua depois de saber da notícia no hospital é uma). Só discordo da Camila no seguinte: embora pesado e tenso, há sim espaço para o riso no filme. Não o riso que nasce da comédia rasgada, da gag ou do pastelão. O riso sutil, do tragicômico. Shannon em cena é divertidíssimo. A própria existência desse personagem já é uma piada pronta: o personagem mais lúcido é o louco. Original? Não. Mas funciona? Funciona.

Lisandro Nogueira disse...

M. Aurelio: você tem razão. A cena do Leonardo Di Caprio é risível. O filme me surpreendeu e a atuação do ator "louco" é excelente.

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