domingo, 27 de dezembro de 2009


Controvérsia esquivada

Túlio Moreira Rocha*

Do Começo ao Fim evita a discussão moral que envolve sua trama e opta pelo vazio melodramático

Causar polêmica no cinema é fácil. Difícil mesmo é polemizar com estilo. Um exemplo: se em Striptease a nudez escandalosa de Demi Moore apenas confirma a narrativa e o conteúdo defeituosos da obra, nos filmes de Pier Paolo Pasolini os corpos despidos dos atores embasam as razões morais e estéticas de um cinema essencialmente autoral. Do Começo ao Fim, de Aluizio Abranches, está mais para o primeiro caso. É frustrante constatar como o diretor brasileiro conseguiu desperdiçar um tema delicado, envolvendo os entraves éticos de um relacionamento amoroso entre dois irmãos, para priorizar a profusão sem sentido de cenas picantes e diálogos de sala de estar de madame.

Conservando-se sempre fiel ao título, Do Começo ao Fim é um filme excessivamente convencional, estruturado em torno de um manjado e pobre começo-meio-fim. De tão burocrático, lembra uma telenovela da Globo, e em alguns momentos-ápice de constrangimento, chega a ser um esboço cinematográfico de qualquer novela produzida no México. Trata-se de um retrocesso para o cinema brasileiro recente, que tem experimentado caminhos estéticos e soluções criativas bastante interessantes, como nos filmes de Karim Aïnouz e José Eduardo Belmonte.

O dramalhão acompanha a história de dois meio-irmãos, Thomás e Francisco, que crescem num esquema a la Lagoa Azul, desenvolvendo desde muito cedo uma intensa aproximação afetiva e sexual. A mãe, Julieta (Júlia Lemmertz, na única performance do longa digna de nota), percebe essa relação peculiar, mas não toma nenhuma atitude mais eficaz no sentido de impedir o envolvimento dos dois. Após a morte da mãe, os irmãos, já adultos, se sentem encorajados a viver a paixão e passam a agir como namorados.

O espectador mais acostumado aos clichês do cinema pode antever um conflito central girando em torno dos embates éticos gerados pela consanguinidade dos personagens principais. Mas não. Abranches erra até na hora de fugir do desenrolar mais óbvio da história. O casal se dá muito bem, não enfrenta nenhum problema (o parentesco é solenemente ignorado) e vive um cotidiano marcado por juras açucaradas de um amor virtuoso e insosso.

O desperdício do cineasta ao abdicar de qualquer embate provocado pelo incesto é agravado pela trilha sonora afetada e desmedida, que corrobora com uma opção melodramática equivocada para um filme que se propõe a tratar de um tema tão complexo. Apesar das locações lindas do Rio de Janeiro e de Buenos Aires, dos rostinhos bonitos e das cenas apimentadas, Do Começo ao Fim é acometido, do prólogo ao epílogo, de um vazio artístico irremediável.

Para quem havia pensado que o cinema nacional não se renderia novamente a sequências empapadas na pieguice, como a do "fantasma" da mãe que nada com os filhos no mar, ou a da troca de carícias pela internet numa cena-ícone da falta de talento dos atores principais, Do Começo ao Fim é uma mancha que poderia ser evitada, se não houvesse, entre os realizadores brasileiros, uma necessidade exacerbada de comprovar habilidade escolhendo os caminhos mais rápidos – e apelativos.



* Túlio Moreira Rocha é aluno do seminário de "Análise de filmes".

1 Comentário

Fabrício C. Santos disse...

Merda do começo ao fim. (me segura no trocadilho, hey!)

Não sei nem por onde começar. Não sei mesmo. Aluisio Abranches, aonde é que você vai com esse comercial de margarina baseado em homossexualidade incestuosa?

Obra-prima do desastre.

p.s.: p.s.: independentemente de ser das coisas mais constrangedoras que já vi, quando saí do cinema do Bougainville, um grupo de umas 5 ou 6 pessoas estavam de mãos dadas lá fora, entre aquelas poltronas, orando. Eles pediam perdão a deus por terem visto o filme, um filme "tão errado" e destinado a levar as pessoas ao pecado bla bla bla.

O filme é muito errado, mas por muitos outros motivos. Esse não. Milk neles!

@fabridoss

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