Em nome do Pai, do Filho e do Cinema
João Victor Guedes*
Os católicos mais radicais devem estar com os nervos a flor da pele no que tange a representação cinematográfica com umas das religiões mais antigas e influentes do mundo. Desde que a sétima arte passou a encantar, criar e influenciar a sociedade, as diversas histórias que circundam a igreja Católica Apostólica Romana tomou rumos que expõe mais os erros do que as glórias e louvores do cristianismo.
A salvação para os pecados, segundo a tradição católica, está primeiramente no reconhecimento do erro. Talvez aí esteja o ponto em que o cinema acha fendas para invadir o mundo místico das religiões. Os filmes giram em torno de erros que a própria igreja condena, mas que comete e não confessa a ninguém.
A começar pelo Profeta. Jesus Cristo tem sido personagem principal em filmes que narram sua história. De filmes brasileiros à hollywoodianos, Ele é figura certa nas telonas em épocas de Natal ou Páscoa. São produções que narram suas peregrinações, conquistas e milagres. Até que o “excomungado” Dan Brown, com 44 milhões de exemplares vendidos, nos decifrou “O Código da Vinci” e colocou em questão a polêmica da suposta vida pessoal de Jesus.
Fé e ciência, sagrado e profano, luz e escuridão. As antíteses ligadas à religião, no cinema, se transformam em muitos paradoxos com o intuito de estimular e colocar em xeque quem é a Igreja Católica. Em “Anjos e Demônios” mais uma vez Dan Brown quer cutucar a igreja com insinuações de que ela é assassina, corrupta e egoísta. Nesses mistérios diversos estão envolvidos quase toda a história da civilização ocidental que, em muitos casos, são contadas com ilustrações e artes baseadas no próprio cristianismo e temperadas com aspectos óbvios do Renascimento por meio de artistas como Leonardo da Vinci e Michelangelo.
Assuntos que o Vaticano procura estabelecer dentro de suas grandes muralhas, o cinema insiste em veicular e arrecadar milhões em bilheterias mundo afora. A Idade Média, período marcado pela brutalidade da Igreja, é tema freqüente em grandes produções. O lado de salvação é posto de lado, colocando em ascensão os pecados feitos e combatidos pela entidade.
Na edição 2011 do Festival de Cannes, Habemus Papam, o diretor Nanni Moretti faz do recém eleito Papa um homem cheio de dúvidas com atitudes impensadas. Nesta história, o conclave se reúne para eleger o novo pontífice. Aos poucos, os cardeais vão sendo eliminados até que se escolhe um favorito. O clérigo interpretado por Michel Piccoli é eleito, mas na hora de aparecer para a multidão na Praça de São Pedro tem uma crise. O para não que assumir seu posto. A burocracia do Vaticano fica atordoada ao ponto de chamar um psicanalista para conduzir a situação.
E as barreiras são tão fortes que os próprios membros do clero arrancam as batinas e vão lutar no lado antropocêntrico. No recente “Padre”, o sacerdote decide atravessar o cerco e quebrar seus votos sagrados indo para o lado dos vampiros para tentar salvar a sobrinha, depois que o mundo foi tomado por esses seres. Não agüentando viver em uma cidade governada pela igreja, o católico herói é capaz de vender a própria alma para salvar a garota.
E a mistura entre o bem e o mal tem sido prato cheio para diretores que querem abordar a relação homem e religião. Filmes ligados a exorcismos, bruxarias e misticismos exploram as peripécias e táticas do mal, que nesses casos, não têm forças para vencer a cruz.
Através dos dogmas e de passagens do livro sagrado cristão, o cinema aparece como o mediador entre a certeza e a incerteza, o certo e o errado, o profano e o sagrado, mas, principalmente, entre o verdadeiro e o falso. Não cabe a nós, meros telespectadores, discutir se é a fé ou a arte quem salvará. Mas sim interpretar o poder e o que levou a uma determinada representação. Que Deus salve o cinema e seus fiéis!
* João Gabriel Gomes é aluno do curso de História do Cinema-UFG 2011.
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