segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Queime depois de ler: os tolos e os despertos.

Os tolos e os despertos

Franco Neto, especial para o blog*

Queime depois de ler [em cartaz - Goiânia], de Etham e Joel Coen, conta a história de Osbourne Cox (John Malkovich), um ex-agente da CIA que, dispensado inesperadamente da atividade, decide escrever suas memórias e publicá-las em um livro. Um CD com os arquivos de Cox é recuperado acidentalmente pela dupla Linda Litzke (Frances McDormand) Chad Feldheimer (Brad Pitt).

Eles exigem uma recompensa pela devolução dos documentos. Os outros envolvidos no incidente são Katie (Tilda Swinton), a esposa insatisfeita de Cox e autora do CD, e Harry Pfarrer (George Clooney), amante de Katie e pretexto para a futura separação daquele casal.

Nas salas de cinema o filme traz uma etiqueta em que se pode ler: comédia. As habituais desavenças em torno dos gêneros não importam aqui, vamos registrá-las como válidas e seguir adiante. Isto posto, a classificação arranjada diz ao espectador como deve receber o filme. Mas isso o induz ao equívoco.

A película dos irmãos Coen não é dessas produções abobadas que exageram os esquetes para forçar o riso. É sobretudo uma história da pequenez humana em suas ocupações mais triviais. Ocupações que são, em realidade, o conjunto daquilo que forma a própria vida. A latente insustentabilidade das relações afetivas (Cox e Katie; Harry e Katie), o trabalho que invariavelmente termina com a aposentadoria (a demissão de Cox), a perda da fugaz juventude (todos os personagens, a exceção de Chad, já passaram dos quarenta).

Temos uma análise sem máscaras de nosso diminuto cotidiano, nossos medos patéticos e crenças instáveis. Contudo, a análise dos Coen se furta, felizmente, do sentimentalismo e da autopiedade. Tudo se passa com um mordaz bom-humor, como se o filme nos dissesse, sem pretensão de medicalização: “não se leve a sério”, afinal, o trágico também pode ser engraçado. É tudo uma questão de como enfrentar o inevitável: rindo-se como um tolo ou, como prefere o filme, como “espectadores” despertos.
* Franco Neto é jornalista.

4 Comentários

Lauro António disse...

Meu Caro Lisandro: visão portuguesa de "Destruir depois de ler":http://lauroantonioapresenta.blogspot.com/2008/11/cinema-destruir-depois-de-ler.html
Um abraço amigo e cinéfilo.

João A Fantini disse...

Não se leve a sério parece ser o fantasma que assombra todos os personagens-chave nos filmes dos Cohen. Da minha parte, concordo.

bruno disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
bruno disse...

O que os Coen fazem e que ninguém mais faz no cinema atualmente é transformar toda e qualquer coisa em uma situação estranhamente próxima, inclusive por assumirem um tom pouco usual, no desenrolar e na maneira como é contada. Me parece que grande parte desse efeito é obtido por uma exímia exploração das personagens, evitando os schemata que predominam no que concerne personagens cinematográficas. Assim é que Fargo se constrói com personagens tão peculiares que, ao mesmo tempo que funcionam como personagens, nos permitem nos aproximar deles de maneira que a história passa a nos atingir de maneira que vai um pouquinho além da quarta parede. O mesmo ocorre com os recentes Onde os fracos não têm vez e Queime depois de ler. O primeiro por ser narrado em função de três personagens que mal se encontram e têm pouco a dizer - aqui o dito é substituído pelo visto e, mais ainda, pelo sentido ou pelo experimentado. Já o último demonstra como pessoas comuns são abalroadas por acontecimentos que lhes fogem ao controle, e no fim das contas o mundo é menos interessante do que parece (no cinema, inclusive). As possibilidades de leitura são várias, e isso é um traço da riqueza do que Joel e Ethan produzem.

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