quarta-feira, 29 de abril de 2009

Frost-Nixon: a entrevista e o filme

Nixon: inseguro, distante e exilado


Laerte Guimarães Ferreira*


Entre as chamadas “democracias ocidentais”, nenhuma valoriza tanto a figura da presidência e do presidente quanto os Estados Unidos. Da mesma forma, valoriza, em particular, a crença no indivíduo, o que possibilita, no que tem de bom, uma sociedade fortemente (e saudavelmente) meritocrática e criativa. Por outro lado, a referência no indivíduo gera também uma sociedade limitada entre vencedores e perdedores (se realmente quiser ofender um americano, colocá-lo para baixo, chame-o de loser) e, na sua versão mais maniqueísta, entre certos e vitoriosos, a serem premiados, e errados e culpados, a serem punidos.

Richard Nixon, por conta do escândalo Watergate (aos mais novos, recomendo assistirem ao excelente Todos os Homens do Presidente) conseguiu, como nenhum outro, estremecer estes dois pilares da sociedade americana, à época já abalada pela dolorosa derrota em curso no Vietnã (consumada em 1975, um ano depois à sua renúncia).

O filme Frost Nixon consegue capturar este Nixon, alheio às circunstancias, distante, inseguro, exilado (ainda que com uma bela vista para o Pacífico...). Captura fisicamente, através da ótima interpretação do ator Frank Langella, que concorreu ao Oscar. Aliás, impossível não comparar este Nixon, taciturno, mesquinho (a cena em que “disputa” com o seu agente literário o cheque, pago como adiantamento pela entrevista com David Frost, é memorável), com o Nixon interpretado por Anthony Hopkins, quase um estadista, que chega mesmo a despertar simpatia (o que pode explicar o porquê deste filme, Nixon, de Oliver Stone ter sido tão mal recebido pela crítica e pelo público).

Frost Nixon gira em torno de uma entrevista que o ex-presidente concedeu, à troca de muito dinheiro, ao comediante e animador de programas de auditório inglês David Frost. Tanto Nixon, quanto Frost viam na entrevista, cada qual à sua maneira, uma chance de redenção. Frost, ainda que bastante popular, buscava ser alçado ao estrelato do jornalismo internacional. Nixon, apostando na mediocridade de Frost, via a chance de conduzir a entrevista e se reabilitar perante a opinião publica.

Baseado em uma peça teatral, o filme recria, de forma convincente e natural, este clima de luta de boxe (Kevin Bacon se destaca como “preparador físico” de Nixon), cujos bastidores alternam ação e depoimentos re-criados. Dos quatro rounds, Nixon vence três. A cada round conquistado, celebra e se revigora. A postura, em geral sombria, desconfiada e curva, se torna mais altiva, mais ereta. No quarto e último round, o imprevisto acontece. Um Frost, que no terceiro round se dava por vencido, abatido e abandonado pelos poucos patrocinadores deste show, joga o adversário na lona. Um Nixon suando (nos três rounds anteriores tinha tido o cuidado de secar o famoso suor da face, o mesmo que em 1960 o fez perder a presidência para John Kennedy), admite seus erros, pede perdão.

A entrevista, antes recebida com incredulidade e desprezo pelas emissoras americanas, se torna um fenômeno de audiência, até hoje não superado. Frost se torna uma celebridade. Quanto a Nixon, uma vez que traz para si, indivíduo, a responsabilidade por Watergate, aos poucos retorna a vida pública e até inaugura a sua presidential library, símbolo máximo de cada mandato presidencial. Em 1994, foi enterrado como chefe de estado, com a presença do então presidente americano Bill Clinton.

* Laerte G. Ferreira é prof. no Iesa-UFG



4 Comentários

José Teixeira Neto disse...

Por que nenhuma referência ao fato de Nixon ter sido o presidente dos EUA que teve a iniciativa de reatar relações diplomáticas e comerciais com a China?

Laerte Guimaraes Ferrira disse...

Sem dúvida, a reaproximação com a China foi um dos grandes feitos do governo Nixon; Contudo, o foco do filme "Frost / Nixon" centra-se nos bastidores da famosa entrevista / luta de box entre entrevistado / entrevistador.
Uma visão mais aprofundada (e polêmica) sobre o assunto pode ser encontrada no filme Nixon, de Oliver Stone; entre as várias polêmicas, questiona-se a real dimensão do então secretário Henry Kissenger nesta reaproximação.

Sergio Arantes disse...

Realmente não vi isso no filme, a história do Nixon com a China. Esse também não é o tema do filme. O quente é a entrevista e o jogo entre os dois. Já o filme de Oliver Stone - Stone é um cineasta apenas razoável e faz filmes ligeiramente embasados em termos políticos.

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