sexta-feira, 9 de outubro de 2009

"O roteiro é o rei", entrevista com Fernando Meirelles.


O CINEASTA DE "CIDADE DE DEUS" E "ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA"
 


A adaptação da literatura para o cinema é sempre uma questão delicada. O que mais te preocupa neste processo?
Livro é livro, e filme é filme. A primeira coisa que me preocupa é que o roteiro seja interessante. Se der para ser fiel, ótimo. Se não der, o roteiro deve ser o rei; se tiver que alterar a obra, altere, porque você tem que ter um bom roteiro. Mas, às vezes, há livros aos quais você pode ficar muito preso e, mesmo assim, produzir uma boa adaptação.

Seria o caso de Ensaio sobre a cegueira?
É, neste caso, a trama do filme é muito próxima, muito parecida com a trama do livro. Mas acho que é bem diferente, porque no Ensaio os personagens não têm muita cara, não tem nome; no filme, embora também não tenham nome e nem passado, você coloca o Gael, fazendo o papel do Rei da Camarata 3 e, imediatamente, traz a personalidade do ator. A mesma coisa acontece com a Juliane Moore, você não olha mais a mulher do médico, mas a Juliane Moore. Mesmo sem querer, você dá cara, dá personalidade para os personagens, o que Saramago não quis fazer. Mas não há como, porque o cinema é visual. E tem outra coisa: no livro, quem narra, quem conta a história é o escritor – é como ele vê as coisas, coloca pensamentos na cabeça dos personagens. No cinema, nada disso é possível. Toda a história tem que ser contada pelas ações dos personagens. Ensaio sobre a cegueira foi extremamente difícil de adaptar, porque é muito pessoal, muito subjetivo, opinativo, tem as ironias do autor, e isso não cabe na ação do ator. Acho que foi uma ousadia do Don McKellar – canadense responsável pela adaptação –, mas acho que acabou saindo bem.

É isto que você coloca como o maior desafio da adaptação?
É isto sim. Para mim, o maior desafio para fazer um filme sempre é chegar ao roteiro, é escrevê-lo. Quando você tem um bom roteiro, 90% está feito; aí, é só ir lá, arrumar um ator e filmar.

E por que resolveu mudar o filme depois da apresentação no Festival de Cannes este ano, antes da estréia no Brasil?
Primeiro, esse negócio de ficar alterando o filme é um processo de todo filme. Todos os cineastas demoram oito, nove meses – o Walter [Salles] demorou quase um ano montando o Linha de passe. Não é que você demore colocando as partes juntas, é o tempo em que você fica mudando para chegar ao melhor resultado. E eu fiquei nesse processo. Aconteceu que, como fomos convidados para abrir o Festival, fechamos e mixamos o filme muito rápido e mandamos. Mas ainda não estava acabado. O ideal é acabar o filme, que na hora está bom, dar uma semaninha e voltar a ele, mas eu não tive essa semaninha.

O interessante é que Saramago gostou do filme. Diferentemente de outros autores que acabam não gostando das adaptações. Quando há essa desavença, como o diretor deve se posicionar?
É, eu tive a sorte de os três autores que peguei – o Paulo Lins, John Le Carré e José Saramago – terem gostado das adaptações. Mas acho que, realmente, é sorte ter pego escritores generosos, tolerantes, que deixaram eu meter a mão no filme, dar uma outra versão, mesmo que não tivesse sido da forma que estavam imaginando. Na verdade, fiquei muito ansioso para saber o que ele ia achar, se seria a história dele ou não. Fiquei feliz que gostou.

Esta é a sua terceira adaptação. Você prefere esse tipo de trabalho a roteiros originais?
Não. Acho que foi coincidência, porque leio bastante. Leio, me entusiasmo com a história e me envolvo. Foi assim com essas obras. Mas tenho dois roteiros começados que são originais. Mas demoram um tempo e, por causa disso, acabo lendo outra coisa e coloco um filme no meio. Mas devo fazer um roteiro original em algum momento da minha vida.

Mas o seu próximo trabalho seria uma adaptação, desta vez de um livro do Jorge Furtado, não é?
É. Na verdade, não é bem uma adaptação. Não vou nem utilizar o mesmo nome. O Jorge escreveu um livro um pouco baseado em Trabalhos de amor perdidos, de Shakespeare. Agora, está escrevendo um roteiro para mim que é levemente baseado no livro dele. Não sei quando vou fazer. É uma comédia de estudantes estrangeiros, em Nova York, que estão fazendo projetos sobre Shakespeare.

Quando você fala “levemente”, acha que as outras adaptações também podem ter esse advérbio?
O Cidade, acho que foi uma adaptação bem livre, porque a estrutura do filme é diferente da apresentada no livro do Paulo, que é muito episódico. Já o roteiro do Bráulio Mantovani é bem-estruturado, tem alguns personagens centrais, coisas que não existem no livro. O do John Le Carré, acho que foi uma adaptação fiel, mas a gente tirou muita coisa, porque é um livro muito grande, de 600 páginas, então, na verdade, demos uma filtrada na obra. E esta do Ensaio, por ser uma obra mais curta, acho que tem a trama mais fiel ao original. ©

* entrevista para revista da livraria cultura - out. 2008

13 Comentários

Candido Cesar disse...

Ei, hoje os jornais de SP mostram o Meirelles como empresário e dono de cemitérios. Que estranho esse cineasta: antigamente os cineastas faziam intervençoes, eram pobres, jornalistas ou escritores. Agora, são empresários e como disse aqui o Rodrigo Cássio, "administradores de oficio".
Ainda bem que ele é um bom cineasta. Mas a envergadura estética dele é limitada. Deus nos acuda!! O mundo mudou muito...

Túlio Moreira disse...

Meirelles é sábio ao dizer que "o roteiro é o rei". Li em algum lugar, de algum cineasta que agora realmente não conseguirei lembrar o nome, que "um bom roteiro pode gerar um bom filme ou um mau filme, mas um mau roteiro só pode gerar um mau filme", hehe

Thomas Silva disse...

Fernando Meirelles ajudou trazer as Olímpiadas para o Brasil. É dele o vídeo do dia da votação.

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