domingo, 21 de fevereiro de 2010

"Invictus", cores em excesso



Trajetória 

Lisandro Nogueira 


Existe algo em comum entre o professor e o terapeuta: os alunos e os pacientes ficam durante um tempo convivendo e, logo depois, vão embora. São profissões solitárias, por incrível que possa parecer. E não poderia ser diferente. Não há o que lamentar e se lastimar. Pelo contrário. Os alunos, como é o meu caso, não os considero como filhos que abandonam o pai.  O professor é um farol para estimular o aluno a ser ele mesmo, cultivar sua própria opinião e prosseguir cuidando do seu barco e das oscilações duras ao longo do mar da vida.

A velha pedagogia ainda insiste na idéia da relação pai e filho, tio-sobrinho. Acredito sim na noção de função paterna provisória. Ou seja, durante um tempo você contribui para o aperfeiçoamento do aluno, através do trabalho de observação e acompanhamento. Há um vínculo do qual fazem parte a orientação, a formação teórica e, sem dúvida, a afetividade. Mas o mais importante é saber do seu papel provisório e da contribuição possível para o outro ser o dono do seu nariz. 

Aprecio bastante quando constato o vôo de autonomia dos ex-alunos. Fellipe Fernandes foi meu aluno e participou do grupo "Cine-análise", junto com Érica Letry, Lorena Verli, Rodrigo Alves e Paula Coutinho. Foram dois anos (2004/05) de bons encontros, bons debates e a edificação de textos preciosos. 


Lembro-me da alegria em ler um texto da Erica, ainda aluna, publicado num domingo, no jornal O Popular, sobre o filme "Olga". Fellipe está realizando outra pós-graduação na Espanha e enviou o texto abaixo sobre "Invictus". Ele construiu  sua visão de mundo com esforço e vontade. Fico feliz em publicar mais um texto de um ex-aluno que edificou seu próprio caminho.

 
Invictus, um filme colorido demais

Dos equívocos que Clint Eastwood se apodera para enganar e convencer o espectador sobre valores distorcidos.
 
 Fellipe Fernandes*


Os publicitários anunciam a esse filme de forma equivocada. Não se trata de uma biografia de Nelson Mandela, mas sim sobre uma passagem inspirada em um fato ocorrido em determidada época de sua vida, mais especificamente enquanto presidente eleito da áfrica do sul.

E não é somente desse equívoco do qual padece a produção em questão. Em complemento à primeira, o filme sofre, em diferentes quantidades (já que devem-se considerar expectativas pessoais), do anúncio que ela faz de si mesma por ter sido dirigida por Clint Eastwood e ter Morgan Freeman e Matt Damon no elenco. Produz engano e isso me faz questioná-la.

“Invictus” é um produto de um time que está ganhando sempre, como o próprio título remete à definição. Eastwood, claro, desenvolveu sua própria forma de filmar e, decidindo não correr riscos, ao contrário do que fez em “Menina de ouro”, “Cartas de Iwo Jima” e, recentemente, em “Gran Torino”, títulos que emitem luz em sua filmografia, o veterano diretor mantem-se com esse lançamento à salvo de críticas, bilheterias e temporada de prêmios.

Filmada na África do Sul, a história sobre a caminhada vitoriosa da seleção nacional de rugby e a influência de Mandela nesse processo, tendo como pano de fundo a recuperação da auto-estima e da identidade de um país saído de um regime racista e separatista e um governo afundado em problemas, em “Invictus” torna-se uma apologia à importância cega da liderança na vida daquele que quer ganhar. O que seria um valor admirável, se não refletisse também o velho complexo competitivo americano relacionado à vitória e, consequentemente, à corrupção do papel de liderança em outras competições às quais corre-se o risco de perder.

O filme e suas belas tomadas de um esporte brutal como o rugby, os gritos da torcida, os planos de identificação regozijante de um mundo tão oniricamente pacífico que é construído numa solução tão simplória das diferenças éticas entre as pessoas daquele país apenas colocando um negro ao lado de um branco, me remeteram imediatamente a "Rocky", filme de John G. Avildsen de 1976, cuja utilização do esporte e da luta em busca da vitória está relacionada ao ponto frágil de “Invictus”.

Em ambos os filmes, a conquista de valores morais como identidade de seus personagens e, consequentemente, como identidade "assumida” de seu espectador abusa de boas intenções daquelas sobre as quais nossas avós diziam encher o inferno. Ali, no escuro da sala do cinema, o espectador, enganado por essas intenções, assume o seu papel catártico e armazena o embrião da idéia em desenvolvimento na pseudo-liberdade que o cinema americano nos dá ao considerar suas produções. Seria ótimo se nos pusesse todos a pensar sobre e não apenas nos transformassem em encubadeiras de reafirmações que os estadunidenses parecem tanto precisar para se sentirem felizes e satisfeitos. Ou seja, vitoriosos.

Esse engano, nos dois filmes, é diretamente proporcional ao processo histórico vivido pelo povo americano em busca de sua identidade nacional em momentos nos quais encontra-se mais fraco. Em 1976, ano de "Rocky”, os Estados Unidos saíam dos escândolos de corrupção de Richard Nixon e aceitava na figura de Jimmy Carter o tão conservador perdão pela saída do caminho de tijolos amarelos que os levaria aos píncaros da glória.

Já em 2009, ano de “Invictus”, o país passa dificuldades com o colapso da economia, o desemprego, duas guerras absurdas, tantos outros problemas, apoiando-se na figura de Barack Obama, seu primeiro presidente negro, cujo discurso de posse e promessa de campanha foi justamente recuperar a identidade nacional.
Aí está o grande problema. Eastwood é um ótimo diretor, ninguém contesta. Mas a mim me parece injusto usar sua tão refinada linguagem técnica para converter em imagens uma história que lhe captura e lhe coloca numa torcida de uma batalha que não é a sua e tampouco ainda é daqueles que estão sendo retratados na tela. E faz isso apropriando-se de conquistas de identidade de um país ao sul de um continente tão mal-tratado que só de chamar África nos provoca a compaixão da qual "Invictus” rouba para si descaradamente.


* Fellipe Fernandes é jornalista e pós-graduado em Cinema. Atualmente cursa mestrado em Cinema e Literatura na Universidad de Alicante, na Espanha.

69 Comentários

Rodrigo Cássio disse...

Parabéns pelo texto, Fellipe!
Também considero um filme problemático em mais de um sentido. Invictus é fraco como melodrama e torpe como discussão da sociedade, das relações étnicas e/ou políticas.
Clint deixa ver os limites que a indústria impõe, mesmo quando o cineasta é autoral e talentoso.
Por isso, a defesa de um verdadeiro cinema de autor ainda é tarefa para hoje.
Um abraço!

Fabrício C. Santos disse...

Não vejo como Invictus, trabalhando com o elemento da cor como trabalha, pode ser "torpe como discussão da sociedade", muito menos das "relações étnicas e/ou políticas". Há um idealismo aqui muito justo e muito coerente com a característica da honestidade dentro da filmografia de Eastwood.

Acho foco no "elemento da vitória" meio óbvio e fácil demais para um filme como Invictus. Me parece que Clint vai bem além, como disse no meu texto. Esse elemento pode estar à frente na narrativa (e como ótimo exemplo de melodrama, algo que Clint, como Sirk, domina), mas em segundo plano no filme.

Mas diversividade de olhares críticos é isso. Vejo um Invictus completamente diferente do Fellipe e do Rodrigo. O meu Invictus é bastante maduro e sólido em sua estrutura clássica.

Fabrício C. Santos disse...

*deixe uma parte incompleta: "bastante maduro em seu corpo crítico".

Pedro e Patricia disse...

O texto do Fabricio sobre Invictus está postado no blog. Logo abaixo do texto do Fellipe.

Rodrigo Cássio disse...

Fabrício,

Não é o elemento da cor que busco para justificar um olhar sobre o filme, assim como penso, diferente do que você diz, que o "elemento da vitória" não é pouco importante. Pois isso que você chama de "elemento da vitória" constitui uma carga ideológica fundamental que o filme não pode dispensar, na medida em que propõe um tratamento da história africana na chave do melodrama.

Em filmes como Invictus, há toda uma singularidade cultural que se curva a valores que lhe são externos; valores que não estão lá gratuitamente, como nota o Fellipe. Entendo nesse sentido a ironia do título ("filme colorido demais").

Não duvido que Clint Eastwood faz bons melodramas (ou bons filmes a partir do melodrama, para não ser um incauto purista). Contudo, Invictus não é um deles. O filme é simplista na maneira de encenar, nos diálogos sem criatividade, nas resoluções de problemas da narrativa, na direção dos atores, etc. os melodramas brasileiros, que são bem fracos, estão no mesmo nível; são mais interessantes, até mesmo pelos desajustes que possuem (afinal, somos meros importadores do gênero). Um ou outro plano de Invictus lembra a boa direção de Clint, em outros filmes. Apenas isso.

Se você pensa o filme como narrativa e melodrama, continuo achando que ele é indefensável: o cinema já foi muito além (o próprio Clint já foi), e Invictus revela-se "descartável". Se você pensa o filme pelas características plásticas/visuais (a cor, como o seu texto ressalta), aí eu pediria pra você notar que o essa característica não pode ser isolada da estrutura maior do filme; logo, voltamos à narratividade e ao melodrama, e o filme continua indefensável.

Não é uma leitura "óbvia" e "fácil demais". Vamos ao filme: ele é que é óbvio e fácil demais. A crítica que negligencia isso, procurando qualidades onde elas são raras ou inexistentes (pois estão nos "detalhes") não me parece muito adequada. Pode ser bom exercício de cinefilia. Mas a crítica tem responsabilidades maiores, a meu ver.

Rodrigo Cássio disse...

Ao mesmo tempo, Fabrício, concordo com o que você diz no trecho:

"Há um idealismo aqui muito justo e muito coerente com a característica da honestidade dentro da filmografia de Eastwood."

Sim, o filme não deixa de ser coerente dentro de uma visão de mundo que Clint assevera em sua obra. No entanto, ao ver filmes como Invictus, esta visão se confirma, para mim, como uma espécie de idealismo ingênuo; um humanismo protocolar que, no estado atual da nossa cultura, já está, de fato, superado.

É como se eu te dissesse que descobri, de repente, a solução para os nossos problemas: a igualdade e a liberdade devem guiar o nosso mundo! Descobri que os homens virtuosos devem libertar aqueles que são vítimas das suas carências "espirituais"! Dito assim, parece muito pouco, não é? Pois é o que Invictus nos diz. E eu realmente acho pouco. Homens virtuosos não o são tão absolutamente; ou melhor ainda, não creio que a virtude se efetive sem condições sociais que atingem coletividades (em vez de homens predestinados), nem a despeito da intensa formação positivada dos sujeitos pela mídia contemporânea (o que desautoriza a virtude como algo substancial, a meu ver), e uma porção de outras coisas que escapa ao melodrama como gênero-base.

São problemas com os quais se pode confrontar Clint Eastwood. Ele pode ser um cineasta coerente. Mas até que ponto isso é um mérito? Até que ponto isso o põe a salvo de críticas? (Voltamos a pensar nas responsabilidades da crítica).

Vejamos o que um Glauber Rocha nos diz sobre "libertadores virtuosos", em um filme como Terra em Transe (todo o problema de Glauber, por vezes, parece ser o da dificuldade de definir um líder, levando a noção de "povo" a um patamar bastante original, que um filme como Invictus é incapaz de prover ao se referir ao povo africano). Aí sim, teremos um discurso mais elaborado; um filme muito melhor. Nesse sentido, receio que o Mandela de Clint Eastwood seja apenas uma ideia torta e vaga da complexidade que envolve os grandes líderes, assim como o Che de Soderbergh ou outros ícones enquadrados na velha estrutura da virtude e da vilania. Devemos deixar de dizer isso, para celebrar o "estilo apurado" de Clint Eastwood?

Vamos em frente. É bom debatermos e dizer livremente o que pensamos, como fazemos agora. Um abraço.

Galtiery Rodrigues disse...

Texto excelente e com uma visão, que de certa forma,faz repensar o filme. Sinceramente, saber de mais uma dobradinha de Eastwood e Morgan Freeman nas telonas, já deixa os espectadores menos armados e mais maleáveis, em função da admiração acumulada ao longo dos anos, e assim fui eu ver o filme: com olhar crítico ameno, consciente e já certo de mais uma grande obra. Ouvi diversas visões sobre, e todas muito díspares. A opinião de Felipe Fernandes é mais uma e, até então, bem original. A minha, sem credibilidade alguma, é fundada na adoração de um fã do trabalho da dupla Clint-Morgan. Gostei muito do filme. Se levarmos em consideração o entretenimento, é evidente que ele cumpre a sua função. Como bem disse Felipe, é colorido e com cenas de encher os olhos. Ao olhar pela ótica do sentido e da moral do roteiro, caímos em uma indagação no mínimo curiosa e pertinente: Acostumados a testemunhar um Clint denso, profundo, psicológico e questionador, estaríamos nós, desta vez, presenciando uma reinvenção do diretor? Hollywood e sua indústria tem culpa nisso? Clint se rendeu ao mercado cinematográfico? Até que ponto isso é bom ou ruim para o cineasta? De bom mesmo, nada. Se gostamos de Clint, é pela linguagem e a "própria forma de filmar", como bem disse Felipe, que ele desenvolveu. Se ele é aclamado, elogiado e respeitado, é por isso, nada mais. É o talento de Eastwood que fez dele o que é. Tadavia, mesmo com toda a pertinência das indagações, pouco creio em uma reinvenção, mas sim na visão de que o roteiro não foi feito para a "forma de filmar" do diretor. Como retratar o que o roteiro de Invictus propõe? Como encaixar a proposta no estilo eastwoodiano? Há uma solução? Invictus é experimental, pelo menos para ele. Prefiro crer nessa versão. É natural esperarmos o máximo do diretor, que mais impressiona o público de cinema nos últimos tempos. A sua obra, desta vez, é no mínimo marcante para a sua carreira e mostra um lado que, talvez, não estivéssemos preparados. Engraçado, que as críticas, em sua maioria, fundam-se, justamente, na perspectiva que se cria, quando o filme vem com o nome de Clint Eastwood. E o que dizer de Morgan Freeman? No geral, dizem que ele salvou o filme. Não vejo o filme como uma obra perdida ou como uma produção sem méritos a ponto de uma única atuação salvá-lo. O Mandela de Freeman é excelente e Invictus é uma obra controversa, capaz de render um debate infinito. Ora pela trama e o roteiro retratado, ora pela grandiosidade dos nomes envolvidos e a expectativa que se cria sob seus desempenhos.

Lembrando: visão de fã.

Fellipe Fernandes disse...

Fabrício,

confesso que fico feliz com a discussão que meu texto está provocando, porque isso me remete aos debates que fazíamos quando estava na universidade e tínhamos um grupo dedicado à análise de filmes.

É dessa época também que me lembro de um texto de Gilles Deleuze, retirado do livro "A Imagem-Tempo", que estudamos para aprimorar o entendimento da narrativa, e que agora retomo para fundamentar o meu ponto de vista.

Nesse texto, o autor dizia que ainda que haja um deslocamento das realidades criadas na ficção para um real que já existe anteriormente, não haveria discussão de que tais realidades não fariam essa transposição por completo. Isto é, permaneceriam presas ao mundo ficcional onde foram criadas e de onde tentaram retirá-las.

Com isso, ele quis dizer que o filme tornar-se-ia mais interessante ao assumir o jogo que envolve os seus personagens, ao invés de escondê-lo e muitas vezes até mesmo recusá-lo. E esse interesse também decorreria da exposição sem máscaras dos poderes intelectuais, educacionais, poéticos, presentes nos filmes. Isso porque a construção dos personagens retratados (para não dizer documentados) a partir da realidade é muito mais complexa ao se observar o movimento descrito por eles quando se colocam ficcionalizados.

Esse é exatamente o ponto que defendo no meu texto e sobre o qual também o Rodrigo discorreu nos comentários acima, especialmente quando escreveu "pois isso que você chama de 'elemento da vitória' constitui uma carga ideológica fundamental que o filme não pode dispensar, na medida em que propõe um tratamento da história africana na chave do melodrama."

Se analisamos um filme, buscamos algo além do que nos propõe os conceitos da semiótica, tomando, por exemplo, as cores e a possível relação que elas estabelecem que você cita. Esse "algo além" está numa espécie de inframundo do filme, ao qual se chega fazendo um estudo minucioso da narrativa, essa salada de signos que transcende aspectos técnicos analisados separadamente.

Dessa forma, o filme de Eastwood, como o próprio Rodrigo colocou, é indefensável, pois, ao mascarar valores, ele subestima a figura do espectador não-consciente da existência do engano e também do poder que ele gera, pretendendo assim que esse mesmo espectador seja passivo e não questione as transformações sofridas pela narrativa e, principalmente, por meio das ferramentas utilizadas para lhe garantir o sucesso.

Muito mais além da discussão entre o que é realidade ou ficção, o que é importante destacar está na forma em que o poder narrativo é criado e como o jogo proposto é utilizado, não o contrário. Se o filme é coerente ou não com a filmografia de Eastwood, pode até ser que seja. Porém honesto, desde logo acredito que não seja.

Quanto ao comentário de galtiery, não acredito que seja somente um problema de roteiro. Ainda que fosse, isso só tornaria a discussão mais fervorosa, pois se presumiria maior responsabilidade sobre o próprio Clint e já partiríamos para um debate insensato que estaria no âmbito ídolo-fãs.

Clint Eastwood não pode se render à industria e ao mercado cinematográfico porque é parte essencial deles, para não dizer que é uma cobra criada dos mesmos. Quanto à culpa, não acredito que exista. Como escrevi num outro texto, culpa, segundo o dicionário, é atitude ou ausência de atitude de que resulta, por ignorância ou descuido, dano, problema ou desastre para outrem. Todavia, para mim, é apenas uma desculpa muito baixa que damos à sociedade – mas também a nós mesmos – na tentativa de negar nossas ações torpes que nos dão imenso prazer.

Sinto em discordar, mas Eastwood nunca foi denso, profundo, psicológico e questionador. Ele sim soube modernizar a velha fórmula cinematográfica elaborada nos primórdios do cinema por D.W. Griffith, o que não se supõe um julgamento sobre qualidade.

Grande abraço,
Fellipe

Fabrício C. Santos disse...

Rodrigo e Fellipe,

não "busco" um determinado elemento para justificar o filme (no caso, o da cor), mas é o que EU enxerguei com mais força no filme, por todas aquelas observações que apontei. Cada filme desperta um olhar crítico diferente, tanto pelo filme quanto pelo observador/espectador.

E em momento algum disse que o "elemento vitória" é pouco importante. É importante, e eu adoro como é feito no filme, mas não me parece ser o MAIS importante. Vê a diferença?

"Contudo, Invictus não é um deles." - afirmo o contrário. Vamos morrer discordando, e sem nenhum estar de fato certo (ou errado) quanto a isso. Aliás, discordo do seu 3º parágrafo inteiro no primeiro comentário.

E também não estou "isolando" a característica, mas destacando-a. Cada crítica procura um foco, e esse é o meu (inspirado pelo que vi no filme), o que não significa isolar. Como disse, também gosto dele como narrativa e melodrama, o qual não acho que seja "indefensável", como você insiste. Mas esse, repito, para que não pareça que estou querendo pregar alguma verdade (que é inexistente na crítica, creio; mas aqui também há quem discorde, o que corrobora essa idéia) é o MEU olhar.

" Pode ser bom exercício de cinefilia. Mas a crítica tem responsabilidades maiores, a meu ver." - diferente de você, não creio que sejam "detalhes". Para mim, saltam aos olhos, transformando-se em primeiro plano. E mesmo que fossem detalhes, não consideraria uma "responsabilidade menor". Mas aí, de novo, é a forma diferente de como pensamos.

Fabrício C. Santos disse...

Rodrigo,

a sua comparação no 3º parágrafo do segundo comentário me parece de uma generalização que, como tal, torna-se tiro no pé. Não creio que isso faça uma obra ser datada ou superada, principalmente por ser "clássica" em vários sentidos. Em uma passagem de "O Pioneers", de Willa Cather, um personagem comenta que na história da humanidade existem pouco mais de 3 histórias a serem contadas, pois todas são variações umas das outras ("O Pioneers" mesmo faz sua versão de Pyramus e Thisbe, história que mais tarde teriam em Tristão e Isolda e, claro, Romeu e Julieta outras versões/inspirações).

O que ocorre (ou pode ocorrer), e muito naturalmente, são obras bem feitas e obras mal feitas, MESMO que seja de tema/narrativa/história/whatever vista e revista um sem número de vezes (caso recente é "Avatar" e a re-re-re-re-recontada história de Pocahontas). E quando digo "história", me refiro a todos os elementos que a complementam, e não apenas o fio narrativo.

E por outro lado, a originalidade por si só não torna uma obra imune, tampouco "melhor". (não estou dizendo que você diz isso).

Agora, Fellipe, acho que o país africano é só um ponto de partida no filme, que se revela de uma noção mais ampla, humana/global.

E encerro repetindo o que já disse ao Rodrigo: filme algum é indefensável.

Discussão boa. Abraços e panquecas,

Fabrício

Rodrigo Cássio disse...

Fabrício,

O que eu diria, para também fechar a discussão, é que encerrar a avaliação de um filme considerando que há simplesmente uma perspectiva MINHA e uma SUA é a pior maneira de fazê-lo. Isso flerta com um tipo de relativismo que considero infrutífero. Não concebo a crítica de cinema desse modo, como disse outra vez a você.

Se estamos pensando a crítica, aqui, há algo mais em pauta que o gosto de cada um, e também há algo mais que o olhar subjetivo de cada crítico. Não se trata de "cada um" escolher seus próprios critérios. Se eu levantar novos critérios a cada filme que assisto, faço praticamente a mesma coisa que o espectador comum, quando considera bons os filmes que lhe dão prazer estético, e ruins os que não o satisfazem.

O que procurei antes foi expor os meus critérios. Fiz isso na maioria dos meus parágrafos. Contudo, você ressaltou e questionou justamente aquele no qual eu expus, sobretudo, o meu gosto mais subjetivo (o 3o. parágrafo); isto é, a minha sensibilidade particular a partir de certa experiência prévia com filmes. E vou ser franco: em melodrama, gosto mesmo é de Fassbinder.

Por causa disso, talvez, você frise que Invictus faz da África algo "mais amplo, humano/global", omitindo que é contra essa falsa reverência de Hollywood ao Outro que se voltam os meus principais argumentos. No mesmo sentido, pelo que escrevi antes, é evidente que discordo da afirmação de que "o que ocorre são obras mal feitas e obras bem feitas". A melhor discussão sobre o cinema está muito além disso, como mostra bem o comentário do Fellipe.

Há filmes indefensáveis quando há uma crítica fundamentada que os avalia com algum grau de objetividade (não absoluta, claro; não falo em termos absolutos; a verdade pode ser, afinal, um consenso, como quer Habermas). Por conseguinte, não há filmes indefensáveis apenas quando relativizamos a tarefa da crítica e supervalorizamos os gostos subjetivos, ou, o que é o mesmo, quando deixamos de pensar em quais são os critérios mais adequados da crítica, e deixamos que cada crítico simplesmente escolha os seus, isoladamente, sem preocupação com conceitos definidos de modo suficientemente objetivo. Mas, nesse segundo caso, eu nem acho que se trate mais de crítica; ao menos não mais de algo que mereça o significado que atribuo a ela (e que, como você deve perceber, inclui uma responsabilidade com o mundo - e já nesse ponto, sou bastante adorniano). Abraço.

Pedro Vinitz, Alemão e Patricia disse...

Ei Lisandro, que debate legal. Você deve ficar orgulhoso, são todos alunos ou ex-alunos. Aind serei aluno de todos vocês: Fellipe, Cássio, Fabricio, Galtiery e, claro, Lisandro.

Fabrício C. Santos disse...

Rodrigo,

a verdade não existe na crítica. Acredito que a crítica é pessoal, não factual. Não é simplesmente "gostar" ou "não gostar", embora você esteja encarando desta forma e considere as palavras do Kléber M. Filho ("filmes são o que são + o que nós somos") algo próximo do "achismo". Já eu acho que isso fortalece a crítica e, sim, a partir (veja bem: A PARTIR) de escolha de critérios. O embasamento é fundamental para solidificar e distinguir o olhar crítico, mas ele não lhe factua, nem com consenso (que tem sua importância).

O Rotten Tomatoes agrega 209 críticas sobre Invictus. 209 críticos distintos. 160 são críticas positivas, e 49 são negativas, cada uma com suas singularidades. Não estou dizendo isso para argumentar que "a maioria da crítica gosta de Invictus" (estou falando "gosta" para ser bem geral mesmo), mas para perguntar: estariam esses 160 críticos, cada um com seus critérios e embasamentos, "errados"?

Temos pensamentos diferentes sobre crítica. Não acho que a sua forma de encarar a crítica seja melhor ou pior que a minha, mas, repito, distinta.

Aproveitando novamente o Kléber, ele citou o Béla Tarr em outra discussão, outro contexto, mas que me parece bem apropriado aqui, inclusive aproveitando de certo sarcasmo: "When you watch my movies, please don’t speculate. Just trust your eyes and listen to your heart."

São palavra meio simplistas do Tarr, mas que sintetizam bem o que quero dizer.

Você parece enxergar a crítica como algo próximo a uma análise acadêmica. Nada de errado com isso, but that's not my cup of tea (para a CRÍTICA).

No mais, já começamos a ficar repetitivos. Vou ali ver competição de Curling. Hugs!

Fabrício
Twitter: @fabridoss

p.s.: procurei uma citação do Jacques Aumont que seria bom para o debate, mas não encontrei. Se achar, volto aqui. Acho que está em "O Olhar Interminável".

Fabrício C. Santos disse...

Exemplo:

A.O. Scott, crítico do New York Times e um dos mais respeitados da nossa querida área crítica, faz a seguinte chamada para seu texto:

"It's an exciting sports movie, an inspiring tale of prejudice overcome and, above all, a fascinating study of political leadership."

A crítica completa está aqui: http://movies.nytimes.com/2009/12/11/movies/11invictus.html

Percebe?

Abraço,

Fabrício C. Santos
@fabridoss

Rafael Castanheira Parrode disse...

Entrando meio que de gaiato na navio tenho só algumas ponderações a fazer: fica muito claro pra mim tanto nas afirmações do Rodrigo quanto do Fellipe uma certa negação ao cinema hollywoodiano, quase que uma demonização na verdade, como se todos ali fossem corrompidos por um sistema, fazendo filmes pra manipular a cabeça de espectadores que não têm qualquer senso crítico (sinto quase que uma paranóia nisso, MESMO).
Me parece que a palavra "crítica" aqui, esta sendo levada completamente ao pé da letra, quase que como censura, como se houvesse um modelo de cinema a ser seguido, ou mesmo um modelo de pensamento que seja imposto por uma condição intelectual. Pra mim o papel da crítica não é sair "convertendo" ninguém, aliás, ao contrário é iluminar caminhos, provocar reflexões (e por mais que eu discorde e muito do texto do Fellipe, acho que em contraposição com o do Fabrício enriquece ainda mais o filme). É claro que teremos sempre a multiplicidade de pensamentos e visões - visões que hora se confrontam, hora se completam - o que não significa que eu esteja negando essa responsabilidade que a crítica tem de lançar todas essas questões sobre o mundo. Também acredito nesse engajamento político da crítica. Só discordo desse pragmatismo, dessa objetividade argumentativa, que subjetivamente é completamente dissonante pra mim. De um lado aqueles que tentam reduzir e simplificar um filme por sua fachada, sua aparência, de outro os que tentam olhar além, buscando outras nuances, outras possibilidades. Isso pra mim é uma opção crítica, aliás, uma postura crítica. E to longe de querer defender o filme aqui (embora todo mundo saiba que s gosto muito dele).

Lisandro Nogueira disse...

Olá Pedro, ex-alunos, alunos e amigos do Blog:

sim! Fico orgulhoso do talento de todos eles. No fundo, no fundo, a crítica de cinema, em qualquer modalidade e tom, contribui decisivamente para a nossa formação. Penso sempre assim: quem faz a crítica do mundo, tende a sofrer menos com as tagarelices e superficialidades do cotidiano. Crítica é um aprendizado constante.

Fellipe e Rodrigo Cássio edificaram uma visada com base nos longos estudos sobre cinema clássico. Comigo eles estudaram bastante o melodrama (Huppes, Oroz, Thomasseau, Ismail, Diderot, Charney). E continuam reforçando e aprimorando esses estudos. Daí, penso eu, o olhar crítico, firme, em relação ao filme. Mas penso que Fabricio dá sua contribuição ao chamar a atenção para a questão do "gosto".

Por outro lado, Fabricio e outros (começaremos dia 29 de março no grupo "cine-UFG, debates", com a conferência do Ismail Xavier sobre Melodrama, uma outra fase de estudos), terão a oportunidade, agora, nesse semestre, de manter contato com essa questão do gosto X juízo estético. Vamos voltar ao Luigi Pareyson ("Problemas de estética) e seu belo ensaio sobre a leitura da obra de arte - além de buscar outros autores.

Confesso que não foi o melhor filme do Clint. Talvez o projeto tenha sido mais do Morgan, afetivamente ligado ao tema. Comparando com outros filmes, chego a pensar que é uma obra "distante" da própria filmografia do Clint: estou exagerando? Vamos pensar.

O mais importante: num momento em que poucas pessoas dão atenção ao processo de reflexão, nós, e os leitores, estamos vivenciando um debate de bom nível, calcado no respeito e nas possibilidades de trocas interessantes. Todos ganham. Vamos continuar...

Rodrigo Cássio disse...

Fabrício: O que quis dizer é que confrontar critérios (fundamentos) é mais interessante que confrontar gostos mais pessoais ou perspectivas diferentes de críticos diferentes (que, naturalmente, existem). A "diversidade" de olhares nem sempre é positiva, a meu ver.

Rafael: Não devemos demonizar Hollywood nem qualquer cinema. Mas Fellipe apresentou críticas contundentes a essa indústria. Há argumentos propostos, e não uma "paranóia". Assim, há duas opções: ou debatemos a pertinência dos argumentos, até onde for possível fazê-lo, ou desviamos deles e afirmamos a "diversidade" de olhares.

A suposta "diversidade", enfim, também possui o seu caráter ideológico...

A propósito, isso é a cara do cinema brasileiro contemporâneo: muita diversidade, pouco debate em torno de propostas estéticas contundentes.

Fellipe Fernandes disse...

Rafael,

foi muito bom você tocar no assunto "negação ao cinema hollywoodiano", porque me dá a chance de dizer que isso não é correto. Não há nenhuma palavra no que eu disse que signifique tal coisa e acredito que eu posso falar pelo Rodrigo também.

Ao contrário, adoro o cinema hollywoodiano que, de certa forma, conseguiu modernizar a forma de fazer filme, ainda que continuassem produzindo seguindo a velha fórmula. Billy Wilder, Alfred Hitchcok, Howard Hawkings, John Houston, John Ford, Robert Aldrich, Charlie Chaplin, Nicholas Ray, Francis Ford Coppola, David Lynch, Martin Scorsese, só para citar alguns.

Você fala também de corrupção pelo sistema e, perdoe-me a sinceridade, esse é um argumento é um tanto ultrapassado, fruto da velha teoria da dependência da luta "socialista" da década de 1960. Clint Eastwood e todos os diretores citados acima, e outros tantos mais, não podem ser corrompidos pelo sistema, porque são frutos do próprio sistema.

Sistema, ao contrário do que muitos pensam, não implica algo que seja maldoso. Nada mais é que a organização de vários elementos que se correspondem e formam um todo organizado. Assim, da mesma forma que Hollywood criou o seu sistema de produção, os franceses também o fizeram, os espanhóis, os italianos, os chineses, os japoneses, os argentinos, e também os brasileiros.

O cinema, Rafael, por princípio, é toda uma manipulação, e não foram somente os americanos, representados por Griffith, que descobriram tal coisa, mas também os russos, especialmente na figura de Sergei Eisenstein. Seus experimentos, por exemplo, os levaram a saber que a primeira ferramenta para a criação da narrativa e consequentemente para estabelecer o jogo de manipulação desejado por quem a faz ou produz é a montagem.

Oras, analisando o cinema de um modo geral, e é sobre isso que falamos Rodrigo e eu quando discorremos sobre a forma muito similar, porém distinta, que temos de assistir aos filmes, vemos que, quando esse jogo é posto nas entrelinhas do cinema, o que fica claro é que toda e qualquer representação feita de um tema, normalmente seguindo os próprios anseios da sociedade na qual o cineasta está inserido, decorre de uma troca estabelecida entre o espectador e os filtros pelos quais passam os assuntos retratados desde o primeiro contato entre eles.

Entre alguns desses primeiros filtros estão o ponto de vista do realizador do filme, o ponto de vista da pessoa que escreveu o roteiro, o ponto de vista de quem o produziu. Toda essa trama já chega armada aos nossos olhos. Sobre isso, é Ismail Xavier quem diz que, nos filmes, temos o lugar da ação, o recorte, o sujeito que observa e a admissão de algo que separa o observador do observado, condição para a delimitação dos contornos da cena. A representação sempre se dá dentro dos limites, tem seu espaço próprio, em oposição ao espaço de quem a observa.

Fellipe Fernandes disse...

Não digo jamais que os espectadores não tenham nenhum senso crítico, pois seria muito equivocado de minha parte se o fizesse. Todavia, não tenho medo nenhum de falar - e aqui evoco a minha mãe como exemplo, uma pessoa inteligentíssima, formada, com um senso crítico muito particular - que o espectador está sim treinado para não questionar o cinema, especialmente, como aqui estamos tratando, o de Hollywood de todos aqueles diretores que anteriormente citei e o próprio Eastwood.

O que nos leva diretamente à discussão do papel da crítica. Em nenhum momento pretendi dizer que minha visão era mais correta que a do Fabrício e que, por aproximação ideológica, que minha visão poderia sair de mãos dadas com a visão do Rodrigo.

Sinto em discordar de você, mas não acho que minha visão crítica seja pragmática e muito menos objetiva. Tampouco estou fazendo um engajamento político em meu texto. Todo cinema representa a busca por uma identidade em diferentes âmbitos. Isso porque, antropologicamente falando, resguardado pelo pensamento do historiador Jean-Louis Comolli, não há construção de identidade sem se considerar o histórico desenhado pelo objeto estudado.

O que talvez diferencie a minha visão crítica é que, por adestramento teórico, sou partidário do grande André Bazin, para quem a função da crítica é elevar o gosto do público, ajudar a “formar” sua visão crítica para que ele se torne independente e passe a criar naturalmente uma demanda por filmes de melhor qualidade.

Para terminar, acredito que, muito mais além de uma discussão sobre o papel da crítica, tomando sua última frase como exemplo ("embora todo mundo saiba que gosto muito dele") e também a frase do Fabrício quando diz "a maioria da crítica gosta de Invictus", já estamos entrando no campo do gosto pessoal, que ultrapassa a noção da crítica, é indiscutível, e me leva a um pensamento típico de minha avó: "o que seria do azul se todos gostassem do amarelo?"

Eis aí uma das razões pelas quais o cinema é tão fascinante.

Grande abraço,
Fellipe

Fabrício C. Santos disse...

Lisandro, só lembrando que quando valorizo o "gosto" (nem eu gosto da palavra, mas facilita aqui nos comentários), não descarto o embasamento. Considero embasamento e teoria importantíssimos, para estabelecer critérios e parâmetros para CADA UM, além de ajudar a construir argumentos (embasar a crítica, comentário etc). Já li e continuo lendo Ismail, Diderot, Bazin, Eisenstein, Arnheim, Munsterberg, Balázs etc, mas o meu ponto é: uma pessoa pode ler, estudar e ver os mesmos filmes que eu, e fazer uma crítica completamente diferente/oposta à minha sobre um filme. Por isso mencionei o Rotten Tomatoes aqui.

Rodrigo, as nossas críticas por si só confrontam os critérios uns dos outros. Escrevemos para isso. Você e Fellipe mostraram por que não gostaram de Invicuts, com seus critérios e argumentos, e eu mostrei os meus.

E você não respondeu: os 160 críticos estão "errados"? A.O. Scott estaria "errado"?

Para finalizar, o Fellipe mencionou Bazin, e precisamente uma parte que concordo, sobre o papel da crítica. Entretanto, quando falei aqui que a maioria crítica gosta de "Invictus" (tomando por base o RT), não foi apenas para evidenciar a questão do "gosto pessoal", mas TAMBÉM o embasamento crítico, uma vez que esses 209 críticos possuem (supostamente, pelo menos; mas muitos seguramente) embasamento, estudo teórico etc.

Hugs,

@fabridoss

Fabrício C. Santos disse...

Vou mudar de filme, mas para usar na atual argumentação: o João Pereira Coutinho (que, creio, todo mundo já leu algo ou pelo menos ouviu falar) escreveu na Folha sua crítica sobre "A Fita Branca", do Michael Haneke. Quem me conhece, sabe que considero Haneke um dos gênios contemporâneos do Cinema, e que vejo em "A Fita Branca" mais uma obra-prima de sua autoria.

Acontece que Coutinho escreveu uma crítica da qual discordo bastante. No entanto, uma ótima crítica, ou pelo menos o que eu considero um exemplo de ótima crítica (incluindo descrever muitos elementos do filme, Rodrigo, algo que você pareceu criticar quando leu a minha crítica sobre "Invictus"; mas, repito, são descrições críticas, assim por serem pertencentes a texto e olhar críticos).

Não achei i link da folha, mas tem aqui nesse blog:

http://zelmar.blogspot.com/2010/02/os-filhos-de-michael-haneke.html

Hugs,

@fabridoss

Rodrigo Cássio disse...

Fabrício,
Não vejo relevância na pergunta sobre os 160 críticos. O que contesto não é a possibilidade de que existam olhares diversos sobre um filme, mas sim a elevação dessa diversidade como um princípio maior da crítica de cinema.
Em todo caso, eu penso que A.O.Scott está errado, sim, hehe.

Fabrício C. Santos disse...

Relevante ou não, gostaria de saber sua resposta. Insisto =)

Ok, VOCÊ pensa (outra palavra para "acha") que A.O. Scott está errado. Naturalmente, já que discorda.

Mas esse pensar/achar só diz respeito a você. Não faz dele "errado" simplesmente.

Hugs,

@fabridoss

Fabrício C. Santos disse...

Sobre "elevação dessa diversidade como um princípio maior da crítica de cinema", leia o que eu disse ao Fellipe no meu antipenúltimo comentário.

Rafael Castanheira Parrode disse...

Voltando a Bazin,também compartilho e muito dessa concepção dele sobre o papel da crítica. Só acho, Rodrigo, que não é necessário "desviar de argumentos para afirmarmos diversidades de olhares". Não foi isso o que eu quis dizer. Os argumentos estão todos ai e eles serão confrontados ou não, seja pela própria crítica, seja pelos leitores dessa crítica.

Fellipe, quando falo dessa "demonização de hollywood", não falo sobre a negação desse cinema já completamente estabelecido como de um Hitchcock, ou de um Ford, Aldrich, Fuller, Chaplin ou Kubrick. E penso nisso exatamente quando vejo a sua comparação (pejorativa) entre Rocky e Invictus. Ao menos pra mim, fica uma impressão de negação desse cinema mais popular e acessível, como se o gosto popular fosse por si só um empecilho crítico para a valiação de uma obra qualquer. Daí penso no cinema do Spielberg, ou do McG, James Cameron, Tony Scott, irmãos Wachowski e fico pensando como essa crítica deve reagir politicamente a esse tipo de produto. Ao mesmo tempo que me pego pensando num cineasta como Haneke e na defesa quase cega de seus filmes (algo semelhante ao que estamos sendo criticados por fazer aqui com Clint). No caso recente de A Fita Branca por exemplo: o pessoal aqui foi quase unânime em apontar Haneke como paradigma desse cinema engajado, relevante e tal, mas as melhores críticas que tenho lido sobre o filme são exatamente aquelas que reconhecem uma visão de mundo extremamente reducionista e ultrapassada no novo filme do Haneke. Isso não quer dizer que eu renegue os argumentos positivos do Rodrigo por exemplo em detrimento dos argumentos negativos do Fábio Santos da Cinética e do Inácio Araújo.

O que quero dizer, é que por mais que vc tenha lido Mauehofer, Baudry, Metz, Verttov ou Epstein, eles vão sempre passar por um filtro que é a sua percepção das coisas, do mundo, e toda a bagagem emocional que cada um carrega dentro de si. Daí a diversidade de posicionamentos. Não acredito em unanimidade, nem nessa rigidez radical dessa crítica que vcs defendem. Me perdoem, mas não consigo enxergar matemática nisso aqui.

Rafael Castanheira Parrode disse...

Não tinha lido esse texto do Coutinho que de fato é muito bom. Mas Rodrigo deve achar que A Fita Branca é incritcável, rs... fazer o que?

Fabrício C. Santos disse...

Sim, muito bom. Do Fábio também. Já do Inácio não gostei tanto (acontece). Acho que, sobretudo, a crítica existe para oferecer um olhar mais distinto sobre uma obra, sem a menor presunção de se estabelecer como "verdade" ou algo irretocavelmente preciso. Sendo assim, nada melhor para a crítica do que sua própria diversidade.

Um filme é constantemente mutável, principalmente na percepção do outro (nós), e mesmo que eu discorde do que eu leio em crítica X ou Y, isso quer dizer que aquele filme foi capaz de criar tais pensamentos e impressões, análises etc. Isso é incrível no Cinema, na arte, e muito pouco "matemático".

Acho "A Fita Branca" uma das melhores coisas que vi nos últimos anos, mas concordo contigo, Rafa: Fábio e Coutinho fizeram dois dos melhores olhares. Porém, o KMF fez o seu excelente a favor. E eu, com um considerável atraso, ainda pretendo escrever algo sobre.

Sobre essa coisa de "matemática" e diversidade, lembrei aqui de um dos livros de Teoria Literária do Terry Eagleton, em que ele analisa a falta de garantia do que é importante e o que não é na Literatura/Arte, do que é referência etc, e que NINGUÉM pode garantir que daqui a muitos anos Shakespeare e outros cânones não serão (boa) Literatura; é um tipo de julgamento que só responde pelo tempo atual.

@fabridoss

Rodrigo Cássio disse...

Fabrício,

Não sei se você está com boa vontade para entender o que eu digo.

Não respondo a pergunta que você propõe porque o número de críticos que aprovam Invictus é indiferente no debate, sejam eles "embasados" ou não. A única coisa que você poderia extrair dessa caminho lógico é uma falácia ad populum, isto é, um tipo de raciocínio inválido que defende teses a partir da aceitação delas por uma maioria. No caso, sendo essa maioria um grupo de pessoas "embasadas", a falácia também poderia ser um argumento de autoridade, ou seja, Invictus é bom porque A.O.Scott, um crítico renomado, diz que ele é bom. Eu acho (frise: acho) que você não quer dizer isso,e tenho certeza que nada disso tem a ver com o que eu disse; logo, por que responderia a pergunta? rs

"Pensar" é diferente de "achar". Eu "penso" a partir de uma perspectiva que assumo para além de uma mera impressão. "Achar", por sua vez, tem a ver com algo sobre o qual não se meditou suficientemente.

Quando penso que alguém está errado, realmente penso que essa pessoa está errada. Por que recusar o dissenso? Eu não tenho problemas em admitir que bons textos podem estar equivocados, como o seu texto sobre Invictus. Ele é bom, mas discordo de você. Não leve para o lado pessoal. Apenas sigo uma outra orientação para pensar e valorar os filmes. Vou ter muito gosto se você confrontar os argumentos que embasam a minha orientação; mas dizer que a diversidade de olhares é o que mais importa é desviar disso, e cair naquela falsa diversidade para a qual chamo a atenção.

Não entendo essa leitura que você faz dos meus argumentos, redundando em um tipo de relativismo que não vem ao caso, pois não tem a ver com a posição da qual estou falando (nela, eu estou pensando a crítica de cinema em si mesma, e não os filmes em particular). Releia o último comentário do Fellipe. Subscrevo tudo o que ele disse.

A propósito, eu não chamaria esse texto do Coutinho de crítica, mas sim de um comentário sobre A Fita Branca. Inclusive, um comentário que omite o filme. Realmente eu discordo do Coutinho (não é a primeira vez). Penso que ele está errado. Ainda posso pensar assim, né?

Lisandro, em suas aulas, costuma diferenciar "crítica" de "comentário". Vale a pena acompanhar.

Fabrício C. Santos disse...

Rodrigo,

eu disse o motivo pelo qual mencionei as críticas do RT. Continuo insistindo na pergunta, que pode ser respondida com um simples "sim" ou "não".

E, se me permite (você me permite?), eu falo que "acho" isso ou aquilo tendo meditado suficientemente sobre o que quer que seja. Acho Invictus um ótimo filme. Mas, se prefere, me dê 1 hora para meditar.

(1 hora depois)

Hmmm, ok. Penso que Invictus seja um ótimo filme.

..

"admitir que bons textos podem estar equivocados, como o seu texto sobre Invictus" - admitir? Então o meu texto é equivocado e pronto? Não há saída? Você está provando que um texto está equivocado? Mas se discordamos, é óbvio que assim pensamos em algum ponto, e, portanto, eu acho (ops, me dê 10 minutos: ok, PENSO) que a sua crítica é a equivocada. Mas isso sou EU quem acha (...pensa), não que assim seja simplesmente.

Estranhamente, depois você fala "Apenas sigo uma OUTRA orientação para pensar e valorar os filmes". É isso que falo desde o começo: "outra", a SUA, uma orientação diferente da minha, do A.O. Scott, do Lisandro, do Rafael, e também do Fellipe, etc.

O meu maior confronto está na minha própria crítica, quando me parece que Invictus se destaca mais pelos elementos das cores no contexto social e político do filme, entre outras coisas (mas principalmente isso). Você não enxerga o filme assim, não vê o filme assim, e não há nada que eu possa fazer sobre isso. Mesmo porque crítica não existe para convencer ninguém (isso seria diminuir em muito o valor da crítica).

Eu chamo atenção para a diversividade porque a sua postura me parece deveras arrogante, e, creio, também assim parece para o Rafael, pelo que ele disse aqui. Outro motivo para a minha pergunta a respeito dos 160 críticos (e não, eu jamais usaria "a maioria" para validar se um filme é bom ou ruim).

"a propósito, eu não chamaria esse texto do Coutinho de crítica" - realmente, temos pensamentos diferentes sobre o que é crítica. Não que a sua não seja, mas são estilos diferentes de crítica, mas, ainda assim, críticas.

Hugs,

@fabridoss

p.s.: com o tempo e muitos debates virtuais, aprendi que é facil as pessoas interpretarem exaltação ou palavras online de forma equivocada. Portanto, faço esse PS para dizer que de maneira alguma estou sendo agressivo. Estou aqui super na paz. Isso aqui tá ótimo =)

Fabrício C. Santos disse...

Outra pergunta: e o texto do A.O. Scott? Você chamaria de crítica, Rodrigo?

Hugs,

@fabridoss

Fabrício C. Santos disse...

Crítica (ou "comentário") do crítico (ou "comentarista") do Kléber M. Filho. Ele não é atingido pelo elemento da cor (ou não parece ter visto como eu vi), mas faz observações que julgo bastante contundentes e de valor numa crítica:

http://cinemascopiocannes.blogspot.com/2010/01/invictus.html

Elaine Camargo disse...

Gente!! Esse blog é pura informação. Eu aprendo muito com esse pessoal. Estou tendo uma aula de debate cinematográfico. É muito chique, isso. Na PUC, onde estudo, nunca tem debate assim. Eu gostei do Invictus. Também não coloco o filme lá no alto, mas no meio. Tá divertido prá caramba.

Fabrício Cordeiro disse...

Aos interessados, minha crítica de Invictus pode ser lida aqui: http://www.agendagyn.com/colunas/cinema_critica.asp

Em tempo: gosto muito do filme, mas não penso (verbo "pensar" identificado, pode passar) que esteja entre os melhores do Clint.

@fabridoss

Rodrigo Cássio disse...

Fabrício,

Receio que eu apenas não pareceria arrogante se dissesse que o filme de Clint Eastwood é muito bom. Pois eu não faço nada, aqui, além de defender ideias. Nunca desmereci você ou o Rafael, nem censurei o que disseram sobre qualquer coisa.

Você me convidou para ler o seu texto pelo Twitter. Eu o fiz com prazer. Elogiei: é um texto bem escrito. Também discordei: poderia ter falado mais das opções do diretor no plano da narrativa e do gênero. Quando é que fui arrogante?

Talvez lhe pareça arrogante eu dizer que um filme é indefensável. Bem, eu tentei justificar isso, que não falo por acaso. Há inclusive um fundamento ético aí, e não acho que seja uma postura arrogante da minha parte. Do mesmo modo, o que penso sobre a diversidade não deveria levá-lo a se sentir censurado. Veja lá no início, quando digo ser muito bom que perspectivas diferentes se expressem com liberdade, aqui. Como você chegou a entender que eu rejeito a importância de diferentes olhares?

É curioso isso: Hollywood colorindo a África com os valores que retiram dela a sua autenticidade; Clint Eastwood inscrevendo toda uma cultura na pasteurização do melodrama; e arrogante acaba sendo quem procura mostrar o quanto essa é a essência de um cinema... arrogante.

No mais, estou acostumado com debates quentes. Fica de boa. Um abraço.

Rodrigo Cássio disse...

Por outro lado, Fabrício, penso que a sua maneira de argumentar é, ela sim, um tanto quanto arrogante. Basta observar as ironias que você faz com a diferença entre "pensar" e "achar", sublinhada por mim.

Será que sou eu que não estou aceitando a diferença de perspectivas, aqui?

Vamos pensar nisso.

Fabrício Cordeiro disse...

Rodrigo, a aparente (repare ali que eu disse que "parece" ser arrogante) arrogância não é simplesmente por discordar, mas como o faz: "indefensável", "admitir um texto equivocado", um pensamento que parece ser quase "matemático" dentro da crítica, a própria autoafirmação "quem procura mostrar o quanto essa é a essência de um cinema", and so on.

Ok, você não respondeu se considera "errados" os 160 críticos que elogiaram Invictus. Me resta, então, supor a possibilidade de que pensa, sim, que eles estão errados (chegaria a afirmar com certeza?), assim como pensa a respeito de A.O. Scott - e afinal, considera o texto dele uma crítica ou comentário? E o do Kléber? Sério, estou curioso.

Queria muito saber suas respostas. Mas, por enquanto: http://i552.photobucket.com/albums/jj331/Fabridoss/davidbowie_disap.jpg

Por favor, não se sinta ofendido com essas minhas impressões, mas é o que sua postura tem passado até então. Discordamos muito, sobre Cinema, Invicus, sobre crítica etc, mas sei lá, talvez a gente concorde sobre açaí. Meu preferido é o da Estação do Açaí, na Rua 4, e o seu?

Hugs,

@fabridoss

Fabrício Cordeiro disse...

Rodrigo, estamos aqui em comentários de um blog, não exatamente escrevendo um estudo acadêmico, por isso achei desnecessário diferenciar "pensar" de "achar", quando na nossa discussão isso claramente não faz diferença alguma.

Debate nos comentários de blog. Ótimo e enriquecedor, muito, mas c'mon, sem excessos de formalidades. Sisudez is not sexy.

Fabrício Cordeiro disse...

Só pra deixar claro: valorizo muito o que você escreveu e escreve aqui, sua visão sobre cinema etc, claramente embasada, mesmo não sendo, como disse, my cup of tea.

Não haveria debate assim se não estivéssemos devidamente preparados, sabendo do que fala. E você SABE do que fala, mesmo que eu concorde com muito pouco.

Outro exemplo é o Rafa, com o qual já tive uns pequenos arrancarabamentos, mas tudo com um bompracismo de humor. Bazinga.

@fabridoss

Rodrigo Cássio disse...

Fabrício, eu também gosto de Açaí!! haha Frequento a Tribo do Açaí, na T-11.

Mas paro por aqui no debate, ok? Difícil dialogar quando a nossa maneira de escrever é interpretada pelo outro como arrogante. E acho que não tenho condições de resolver isso, a não ser parecendo ainda mais arrogante, o que não desejo ser.

Abraços

Rodrigo Cássio disse...

Então você não deve ter entendido que eu apenas diferenciei "pensar" de "achar" porque você escreveu o seguinte, antes:

"Ok, VOCÊ pensa (outra palavra para "acha") que A.O. Scott está errado. Naturalmente, já que discorda."

E a maneira como você escreveu força uma interpretação do que eu disse que não era correta!

Rodrigo Cássio disse...

Eu sou bem-humorado, Fabrício. É que você não me conhece pessoalmente. rss

Agora, em vez do Açaí, podemos tomar uma cerveja mais tarde, depois de Síndromes e um Século, no Cineclube Cascavel.

E é isso!

Fabrício Cordeiro disse...

"Ok, VOCÊ pensa (outra palavra para "acha") que A.O. Scott está errado. Naturalmente, já que discorda."

Escrevi isso para demonstrar a pessoalidade do seu pensamento, no sentido de "você acha, sua opinião, você pensa", sinonimamente. Mas talvez eu não tenha sido claro quanto a isso, admito. Por outro lado, creio que isso deveria ter ficado claro no que disse depois: "Mas esse pensar/achar só diz respeito a você. Não faz dele "errado" simplesmente." Ou seja: para a discussão que está sendo travada, não faz diferença alguma dizer "pensar" ou "achar", carambolitas, rs.

Cara, dê um tempo na Tribo do Açaí e vai lá no começo da rua 4, bem perto da Cervejaria (chegue na 4 pela Araguaia e vire na contramão da rua): Estação do Açaí. É um restaurante natural, preços bem em conta. O açaí de lá é metade do preço da Tribo, e acho melhor. Também recomendo MUITO o suco de açaí, que é CREMOSO. O lugar também tem um bolo de banana indecente =)

@fabridoss

Fabrício Cordeiro disse...

Não bebo cerveja. Parei há quase 2 anos, hehe. Minha presença no Cascavel é incerta. De qualquer forma, fica a idéia de um post sobre o filme aqui no blog e, claro, mais um debate em comentários.

Mas há chances de eu ir. Serei o cara com um coala nos braços.

hugs,

@fabridoss

Fellipe Fernandes disse...

Fabrício,

relendo todos os comentários, inclusive os meus, vejo que o debate está indo cada vez mais para um lado que, pelo menos para mim, é desinteressante.

Não quero discutir se as pessoas que gostaram de Invictus estão certas ou erradas, porque tampouco estou discutindo se, pelo fato de terem falado bem ou não do filme, têm razão ou não em fazê-lo.

Alguém disse num dos comentários que não acredita na unanimidade e, pelo menos para mim, sua defesa parece buscá-la agrupando pessoas que compartem, de uma maneira ou de outra, o seu ponto de vista. Eu tampouco - e desde logo - acredito em unanimidade e é justamente por não crer nela que defendo o poder da crítica de ir mais além, de apresentar argumentos que, se não convencem ao espectador, ao menos o fazem pensar sobre o filme e formar uma opinião própria.

Também não entendo a sua insistência para que se responda à pergunta se estão "errados" os 160 críticos que gostaram do filme, porque me parece que você espera que digamos que sim. Não tenho como respondê-la, porque não li os 160 textos. Todavia, ouso dizer que, se eles não enxergam o problema ético sobre o objeto retratado em Invictus, eu penso sim que eles estejam errados e muito.

O que não invalida as opiniões deles, pois afinal, como a unanimidade não existe, tampouco as opiniões deles, como também a sua e a do Rafael, não invalidam a minha. Todas as opiniões coexistem de forma a dialogar e não estabelecer cabos de força para saber quem sai vencendo.

Gostar ou não, mais uma vez digo, não é o foco dessa discussão e, se por um acaso estamos nos esquecendo dele, vale a pena relembrá-lo: a análise da narrativa problemática de um filme mediano, que não funciona nem como melodrama (veja “As Pontes de Madison”, do próprio Eastwood, e creio que você notará a diferença sobre a qual estou falando quando digo melodrama).

Faço questão também de pela segunda vez afirmar que não existe nada de pragmático e matemático numa análise fílmica e muito menos num debate. Você não precisa concordar comigo, mas deve ao menos considerar, nem que seja por um segundo sequer (ou uma hora, como você parece preferir), se meus argumentos são pertinentes ou não.

Nisso eu tenho razão ou estou quixoteando?

Abraço,
Fellipe

Rodrigo Cássio disse...

Fabrício,

Não beber cerveja é realmente um problema! Vamos debater isso. rs

Se você for ao Cascavel, eu serei o cara alto e sisudo, no canto, vestindo uma camiseta com o rosto do Clint Eastwood embaixo de um grande "X" vermelho. haha

Valeu! Um abraço

Fellipe Fernandes disse...

Ah! e como não tenho como partilhar o chopp (o açaí, o café, o que seja) pela impossibilidade da distância, caso passem por aqui nos próximos meses, ficarei feliz em convidá-los para uma paella. Que tal?

Outro abraço derradeiro,
Fellipe

Fabrício Cordeiro disse...

Fellipe,

"Alguém disse num dos comentários que não acredita na unanimidade e, pelo menos para mim, sua defesa parece buscá-la agrupando pessoas que compartem, de uma maneira ou de outra, o seu ponto de vista".

Não. Não acredito em unanimidade.

..

"vale a pena relembrá-lo: a análise da narrativa problemática de um filme mediano, que não funciona nem como melodrama (veja “As Pontes de Madison”, do próprio Eastwood, e creio que você notará a diferença sobre a qual estou falando quando digo melodrama)."

Não vejo problema na narrativa; não considero o filme mediano; acho que, sim, funciona como melodrama, um ótimo melodrama, embora também prefira "As Pontes de Madison" e, adiciono, "Menina de Ouro".

Sim, argumentos bem embasados são pertinentes (fiz um comentário direcionado ao Rodrigo exatamente sobre isso). Não que eu venha a concordar. Com os de vocês, não concordo.

@fabridoss

p.s.: também gosto de um cachapa.

Rafael Castanheira Parrode disse...

"Todas as opiniões coexistem de forma a dialogar e não estabelecer cabos de força para saber quem sai vencendo."

essa é exatamante a questão que tento colocar ao longo de toda e discussão e que me pareceu ser renegada principalmente pelo Rodrigo e com o papo um tanto radical de "filme indefensável".

Entendam, eu não vejo problema ético nenhum em Invictus simplesmente por ele ter sido feito por um cineasta americano (e não necessariamente e efetivamente pela indústria hollywoodiana). Aliás isso pra mim é completamente desprezível dentro da minha percepção critica sobre o filme. Da mesma forma que não vejo problema algum no filme se encorar no melodrama, coisa que Clint tem exercitado e experimentado ao longo de toda a sua carreira como diretor. Filmes denúncia sobre a África e o apartheid existem aos montes (e provavelmente nesse sentido seria muito mais fácil gostar de um filme como Hotel Ruanda então). Inclusive filmes africanos como os do Abdehamane Sissako (Bamako principalmente). Por quê então esperar que Clint faria um filme com esse engajamento social e político, sendo ele mesmo um estranho, um outsider?

Minha questão com o filme está justamente aí. O que enxergo ali me parece o extremo oposto do que os detratores do filme enxergam, como disse no txt (que não sei se é crítica ou comentário, rs) do meu blog. Pra mim, todas essas questões ficam totalmente em segundo plano diante de outras questões que pra mim são muito mais importantes e pertinentes em relação ao filme. Acho muita ingenuidade dizer que Clint e seu filme são ingênuos. Não vejo ingenuidade alguma ali, ainda que as questões que vcs julguem primordiais sejam tratadas com total superficialidade. Acho que é apenas uma mudança de foco, por quê esses problemas em si não dão conta da dimensão do filme, aliás nem lhe interessam tanto.

No mais, ainda pensando na possibilidade da cerveja depois de ver Síndromes e um Século. Tinha prometido pra mim mesmo que não beberia mais durante a semana. Mas acho que quebra paus em botecos são sempre muito divertidos e vão muito bem com cerveja! hehe

E ainda não decidi a camiseta que eu vou, mas to tendecioso a usar uma escrita "FUCK HOLLYWOOD" que é a minha camiseta mais cool! ;)

Fellipe Fernandes disse...

Rafael,

creio que esse será minha última resposta aqui, não por não querer continuar o debate, mas sim pela quantidade de coisas que tenho que fazer a partir de amanhã e que requerem o meu foco.

Bem, vejamos:

a) "eu não vejo problema ético nenhum em Invictus simplesmente por ele ter sido feito por um cineasta americano (e não necessariamente e efetivamente pela indústria hollywoodiana).

Eu também não vejo nenhum problema ético em “Invictus” pelo fato de ter sido feito por Clint Eastwood. Para mim, o problema ético está no tratamento dado por ele à história que conta. Poderia ter acontecido se fosse um diretor inglês, espanhol ou qualquer outro (como normalmente acontece nos filmes sobre a ditadura no Brasil).

Todavia, já que foi feito por um americano e em Hollywood, eu não posso simplesmente descartar que os problemas presentes na narrativa desse filme também não se relacionam a isso pelas razões que já expus nos comentários acima.

b)"Por quê então esperar que Clint faria um filme com esse engajamento social e político, sendo ele mesmo um estranho, um outsider?"

Ninguém espera, ou melhor, eu não espero que Clint faça filmes com engajamento sócio-político. O que quero como espectador que considero ser e com uma visão crítica que luto diariamente para ter é que, como um bom cineasta que é, resolva melhor os problemas que a narrativa do filme dele apresenta.

c) "Pra mim, todas essas questões ficam totalmente em segundo plano diante de outras questões que pra mim são muito mais importantes e pertinentes em relação ao filme."

Fui ao seu blog e li seu texto. Revi seus comentários. Ainda não sei quais são as questões que são realmente pertinentes para você. Não estou sendo irônico, muito menos sarcástico. Não me entenda mal. Por isso pergunto: quais são as questões mais importantes para você? O que você vê ou o que querem que você veja por meio da sedução de um filme com uma história, poderíamos até mesmo dizer, “politicamente correta”?

d) "Acho muita ingenuidade dizer que Clint e seu filme são ingênuos."

Eu não disse isso, porque nenhum dos dois o é.

e)"Acho que é apenas uma mudança de foco, por quê esses problemas em si não dão conta da dimensão do filme, aliás nem lhe interessam tanto."

Aqui você vê mais ou menos a mesma coisa que eu, no entanto por um prisma distinto ao meu. O meu prisma é: sim, houve mudança de foco, os problemas que tratamos não dão conta da dimensão do filme que são muito maiores que ele e assim é justamente porque esses problemas não lhe interessam tanto.

f)"E ainda não decidi a camiseta que eu vou, mas to tendecioso a usar uma escrita "FUCK HOLLYWOOD" que é a minha camiseta mais cool! ;)"

Perdoe-me a intimidade, mas a camiseta com que você vai é o menos importante. Apenas vá com a cabeça aberta e disposta a entrar em contato com novos pontos de vista.

Abraço,
Fellipe

Fabrício Cordeiro disse...

No livro sobre teoria de cinema do J. Dudley Andrew, logo no começo, no Prefácio, ele diz o seguinte:

"Podemos chamar a crítica de 'teoria cinematográfica aplicada', exatamente como chamamos a engenharia de 'ciência física aplicada'. Mas devemos sempre lembrar que a crítica cinematográfica PODE SER FORTUITA E CASUAL [as maíusculas são minhas] ou pode ser sistemática, progressiva e formal."

Hugs,

@fabridoss

p.s.: eu tenho uma camiseta com as torres gêmeas e um aviãozinho em direção a elas, com o símbolo da Nike desenhando o movimento do avião e o escrito "Just do it". Humor negro que faz com que eu tenha de usá-la com cuidado.

Fabrício Cordeiro disse...

"Hotel Ruanda". Bem lembrado, Rafa. Ali sim, vejo um melodrama pessimamente conduzido, e que me faz separar melodrama de dramalhão. Céus, aquela cara do Don Cheadle, a cena da estrada de corpos, as várias tentativas lacrimosamente descaradas de fazer um "A Lista de Schindler" (que acho maravilhoso, inclusive em seus toques mais melodramáticos, mesmo a cena dos chuveiros, me fazendo contrariar o Godard, cujo radicalismo me irrita) da África.

Fellipe, acho que o ponto central da crítica (sim, crítica) do Rafael, o mais importante para ele, está aqui: "Por isso pra mim, claramente Invictus é um filme de discurso. O discurso da tolerância, do perdão, da sublimação..."

Nice, Rafa =)

@fabridoss

Rafael Castanheira Parrode disse...

Pessoal aqui ta precisando ver "Le Pont des Arts" do Eugène Green!

Marcelo disse...

É por isso que estou sempre por aqui, textos e comentários inteligentes. Obrigado prof Lisandro por ser um grande e bonito farol; consistente, sereno e humano.
Bonito debate.
Fellipe, parabéns pelo texto e comentários.
Um louvamento a todos, mesmo aos mais "ressentidos".

Sei que não vale muito aqui mas vai a opinião de quem não estudou cinema: Eu achei Invictus um filme médio, em relação aos próprios filmes do Clint. Mas o tema do filme vale o filme, o filme por si só é um melodrama chato.
Abraço a todos
Ps. Morgan Freeman leva o Oscar de melhor ator e UP o de melhor filme.

Rodrigo Cássio disse...

Amigos,

Voltando a falar sério, pra realmente finalizar, eu gostaria de dizer que é tão importante ler e pensar sobre o cinema quanto assistir filmes e gostar ou não deles. Isso vale, claro, para qualquer pessoa que queira manter uma relação mais ativa com o cinema. Por exemplo, escrevendo críticas.

A onipreseça dos filmes no nosso cotidiano e certo menosprezo da sociedade pelos estudos de artes acabam contribuindo para que o cinema se torne um objeto de debates que não levam em conta uma formação continuada do olhar e do senso crítico.

Ninguém se julga capaz de receitar um remédio tão bem quanto um médico, mas é fácil encontrar pessoas que se julgam tão capazes de avaliar filmes quanto alguém que estudou anos e anos para isso.

Nessa conjuntura, sinto que as ideias mais interessantes já produzidas sobre o cinema são pouco valorizadas (quando não ignoradas completamente) por muitos autores, inclusive talentosos. Isso ocorre em todos os âmbitos, sem excluir a academia. Ocorre com o Coutinho, por exemplo, trazido ao debate há pouco.

Quando separo "crítica" de "comentário", apesar de o Fabrício não ter entendido ou não ter dado importância, falo de uma diferença que deve ser notada e servir como ponto de partida para uma reflexão que extrapola o debate sobre Invictus: o que significa pensar o cinema e escrever críticas de filmes? Esse tema fascinante merece ser tratado com mais cuidado.

Não se trata de querer impedir que as pessoas escrevam sobre os filmes com liberdade. Longe disso! Mas liberdade não deve ocasionar um igualitarismo injustificado. Vamos ler, por exemplo, o que o Ismail Xavier fala sobre o melodrama em "O Olhar e a Cena". Como colocar em um mesmo patamar o trabalho de Ismail e o do crítico A.O. Scott? Não desmereço o Scott. Mas basta observar o texto e a fundamentação de cada um para perceber que temos ali diferentes maneiras de abordar o cinema, e com Ismail estamos muito além do texto jornalístico do The New York Times, praticado por Scott. É a essa diferença que me refiro quando falo da importância do embasamento.

Somos todos aprendizes, e dialogar com respeito e seriedade nos ajuda a crescer. Gosto de debates em blogs, porque nos levam a sistematizar as ideias com um rigor maior do que quando falamos (Deleuze já avisava: a fala é "suja" e a escrita é "limpa"). Aprender é um processo que passa pelo outro, que sempre pode oferecer algo, principalmente quando há dissenso. Por isso o igualitarismo e a falsa diversidade são problemáticos: andando juntos, eles na verdade dissipam a discussão e forjam equivalências que não têm razão de ser.

Ao mesmo tempo, o pior debate é aquele que quer apenas refutar a tese adversa; o que não significa que não devemos defender com firmeza uma posição. Eu sempre defendo com firmeza a minha, e gosto de ser confrontado com seriedade. E vamos aos filmes, como diria o Fassbinder!

Abraços a todos.

Expedito dos Correios disse...

Critico de cinema gosta de complicar. Fabricio tem razão e Rodrigo e Fellipe rebuscam demais. Penso assim. Chão-chão na hora de ver um filme.

Caroline Pires disse...

Uau...
tinha tempo que não vinha no blog e li "55 comentários" até achei que estava errado!! hehehe Que bom ver um debate assim!

P.S.: Prof... sentimos sua falta na nossa colação de grau! Foi uma cerimônia muito emocionante!

Lisandro Nogueira disse...

Olá Caroline, que bom sua presença. O debate realmente de bom nível. O blog está sempre aberto. Apareça sempre e traga seu texto.

ps- não foi possivel participar da formatura: início de ano: seleção do mestrado, burocracia acadêmica, acertos de disciplinas e viagens. Fiquei sabendo que foi muito bonito.

Lisandro

Fabrício Cordeiro disse...

Rodrigo, dei importância, senão não teria respondido sobre. Aliás, decidi fazer citação a J. Dudley Andrew justamente por causa disso.

Me parece muito equivocado de sua parte presumir que um crítico como A.O. Scott não possua conhecimento teórico (é o que entendi pela sua comparação com o Ismail, o que me leva a pensar que você não tem a menor idéia de quem seja Scott), simplesmente pelo ESTILO de crítica dele (e da americana em geral) não corresponder com o que você entende como crítica.

Pelo seus comentários, parece que você exerga como críticas aqueles textos que vão citar algum teórico, buscar nomes e estudos, deixando isso muito claro no texto. Mas volto a lembrar J. Dudley Andrew, que mencionei comentários acima. Por trás dos textos de A.O. Scott, Roger Ebert, KMF, Coutinho, Jonathan Rosenbaum, entre outros dos que considero importantes, há um forte embasamento e estudo, sem que seja necessário explicitar em texto, salvo raras exceções. Particularmente, não gosto de postura teórica explícita em críticas - isso me parece apropriado e bem mais interessante em livros e artigos teóricos.

Não há como colocar Ismail e Scott num mesmo patamar, simplesmente porque eles não estão e não querem estar no mesmo patamar. O que eles fazem são coisas muito, muito diferentes.

Hugs,

@fabridoss

Fabrício Cordeiro disse...

Duas coisas que acho importante ressaltar nessa diferença entre Ismail e Scott, cuja comparação de "mesmo patamar" não faz muito sentido.

1) Dos autores. Você diz: "Vamos ler, por exemplo, o que o Ismail Xavier fala sobre o melodrama em O Olhar e a Cena", e questiona compará-lo ao trabalho de A.O. Scott. Acontece que, como você mesmo disse, Ismail escreve em um LIVRO sobre melodrama, especificamente. Scott não está e nem mesmo quer versar sobre melodrama no texto de "Invictus", e sim fazer uma crítica sobre o filme. Há um abismo de diferença.

2) Dos espectadores. O público alvo do livro de Ismail e das críticas de Scott (e da crítica em geral) é bastante diferente.

A teoria vista nos livros de Ismail Xavier é inacessível para o grande público em geral, tendo um linguajar mais específico, preciso e, ora, teórico, apreciado quase que somente por aqueles que possuem interesse em aprofundar seu conhecimento cinematográfico. Já A.O. Scott e a maioria dos críticos escreve em veículos sociais jsutamente para esse público geral, que é o público que vai aos cinemas, assiste a filmes. Isso NÃO quer dizer que tais críticos como Scott não possuem embasamento, ou não tanto quanto Ismail etc, mas seus trabalhos são muito distantes um do outro. Eles ocupam funções diferentes (o que tampouco impede que um exerça a função do outro vez ou outra). A meu ver, seria muito insensato - para não dizer elitista - destilar todo um conhecimento teórico em uma crítica destinada ao espectador em geral. Por sua vez, esse "espectador" geralmente é visto como aquele que é treinado para não questionar, mas isso não deve ser generalizado, e muitos desses espectadores não devem ser subestimados.

Hugs,

@fabridoss

Fabrício Cordeiro disse...

Eis aqui um outro texto de A.O. Scott, agora sobre Martin Scorsese. Perceba que, por mudar o foco para algo mais "article", há uma maior liberdade para afunilamento, menções, citações, análises etc. Mas, ainda, diferente do que Ismail faz.

http://www.slate.com/id/43803/

Rainer Sousa disse...

Esse filme não pode ser visto como um "equívoco" na filmografia do Clint. Ao contrário do que muitos disseram aqui, "Invictus" não consiste em uma fórmula segura em que Eastwood foge dos riscos que assumiu em filmes considerados bem mais interessantes e ricos.

"Invictus" justamente quebra com a sequência de filmes em que o diretor expõe, de forma muito curiosa, que algumas mazelas da vida e do indivíduo não tem fácil resolução.

Tendo o que entendo como um grande senso de autocrítica, Clint aposta em uma narrativa que se mostra autônoma a esse infinito mantra que coloca o melodrama como a chaga imperdoável de todos os filmes problemáticos.

Focando na figura carismática de Mandela e sem exigir uma atuação intensa de Damon (que poderia conferir bem mais dramaticidade ao filme), ele mostra que essa noção de vitória (que surge como uma irônica herança do imperialismo britânico) pode ser gerar frutos que escapam das críticas tradicionalmente reservada a esse tipo de discurso.

Rodrigo Cássio disse...

Fabrício,

Bem, o que você entendeu não foi exatamente o que eu quis dizer. Quando separo o trabalho dos autores em patamares diferentes não penso na possibilidade de que eles POSSUAM conhecimento teórico ou não. Até porque, na maior parte dos textos críticos, realmente não há explicitação de fundamentos, e eu tampouco afirmo que deveria ser assim. Eu não posso julgar o trabalho de um crítico pelo que ele já leu, mas sim pelos textos que ele publica (o que ele já leu é inacessível, na maior parte das vezes, a não ser implicitamente). Não suponho nada sobre o estudioso A.O.Scott para além daquilo que os textos dele, como crítico, me permitem fazer. Possuir conhecimento teórico e produzir textos relevantes para o pensamento sobre o cinema são coisas diferentes. Meu foco está no segundo item. Scott tem sua relevância; mas eu a vejo menor que a do Ismail, do Comolli, do Aumont, do Bordwell, etc.

Como você mesmo diz, há uma diferença de estilo muito grande entre autores. Mas não só. Há funções que cada crítico exerce em seu próprio lugar; há circunstâncias que determinam limites aos textos, etc. Mais uma vez, insisto que não menosprezo o trabalho de nenhum autor, do mais resenhista àquele que faz citações de teóricos nas críticas. O Coutinho que escreva os textos dele. No entanto, o que ele geralmente faz não é crítica; ele não pensa especificamente o cinema, que aparece como uma "ponte" para discutir outros temas. O caso do Scott é diferente, claro, porque ele é um crítico. Mas isso não nos obriga a considerar a obra dele tão sólida quanto a de outros autores.

Assim, importa-me diferenciar os trabalhos para encontrar as teses mais frutíferas e rigorosas, as linhas de continuidade que se mostram mais contundentes. São critérios como estes que sinalizam a melhor crítica de cinema. Logo, estou interessado no melhor que vem da diferença, e não no nivelamento que "iguala" a todos em um único chão (e é isso que você faz, contestando a minha separação de autores em patamares). Não estou preocupado, por exemplo, com a dificuldade que a maior parte dos leitores possa ter com a obra de um crítico de escrita mais acadêmica (a propósito, Ismail não tem sempre esse estilo técnico que dispersa leitores; você já leu O Olhar e a Cena?). O que me importa é: de que modo a crítica pode contribuir para o pensamento sobre o cinema? De que modo se pode exercer a crítica em função da compreensão dessa arte? Não quero que todo mundo vá parar na academia, escrevendo como acadêmicos. Isso seria insanidade.

Lisandro Nogueira disse...

Lembrando sempre: a crítica, principalmente de formato jornalístico, trabalha com a informação e a avaliação. Essa avaliação acolhe de forma justificada a questão do gosto. O "gosto" (não um gosto qualquer, mas obviamente calcado na edificação de uma cultura cinematográfica, leituras, sensibilidade, etc - o que fazemos aqui no blog) de uma maneira geral, tende a ser predominante nesse tipo de enfoque.

Aqui valem tb. os comentários extra-filme (produção, atores, etc) que fornecem muita informação sobre o filme. E convidam o público para uma primeira aproximação mais demorado com ele. Seria um primeiro passo.

Por outro lado, temos a "Análise", cujo objetivo "é esclarecer o funcionamento e propor uma interpretação da obra artística" (Aumont).

A análise demanda outro tempo, outra maturação. A crítica é imediata, eivada de emoção (aqui, nenhum problema quanto a essa emoção) e aponta sempre para uma certa "classificação" e hierarquia das obras, nos moldes do bom jornalismo crítico.

Por isso, devemos sempre valorizar a crítica pela sua importância na formação. Ela agrega, convida, estimula. Outrossim, ela é o primeiro momento fundamental para quem quer se lançar no terreno um pouco mais demorado e profundo da análise.

A crítica não prescinde da teoria, da história do cinema. O crítico consegue articular melhor suas ferramentas de observação quando se aproxima dos autores experientes com a Análise.
Esses autores quase sempre trilharam um longo caminho realizando críticas e, principalmente, Análises. Acumulam, armazenam e disseminam parâmetros inteligentes (nenhum pode ser encarado como "a verdade") para que todos os críticos e interessados em cinema posssam erguer sua visão de mundo mediada pelo cinema.

Fabrício Cordeiro disse...

"Logo, estou interessado no melhor que vem da diferença, e não no nivelamento que "iguala" a todos em um único chão (e é isso que você faz, contestando a minha separação de autores em patamares)."

Pelo contrário. O que eu falei foi exatamente sobre a diferença entre eles. Sendo assim, considerar A.O. Scott "menor", quando o que ele faz é totalmente diferente (não melhor, não pior) de Ismail. E "O Olhar e a Cena" NÃO é acessível para o grande público.

No mais, taí o que o Lisandro disse.

Hugs,

@fabridoss

Rodrigo Cássio disse...

Fabrício,
Que isso, cara, O Olhar e a Cena, pra mim, é um exemplo de texto acessível que não perde a profundidade. Muito gostoso de ler.
Abraço,
Rodrigo

Fabrício Cordeiro disse...

Também acho gostoso de ler, mas não diria que seja acessível para o grande público.

Fellipe Fernandes disse...

Fabrício,

quero acreditar que, quando diz "acessível", você está se referindo ao fato de muitas pessoas não saberem da existência da obra e não pelo fato de ela ser muito complicado para o entendimento da maior parte das pessoas.

se esse for o seu entendimento, concordo que não é acessível. mas assim o é justamente porque os textos onde deveriam figurar citações dessa obra, para que as pessoas ficassem cientes de sua existência, não as fazem.

aí voltamos naquela discussão sobre a função da crítica e do crítico. Concorda?

Abraço,
Fellipe

Herondes Cezar disse...

Pois é! Samuel Fuller estava certo quando disse que o cinema é um "campo de batalha". Há mais de 50 anos sou um espectador de todos os tipos de batalha que o cinema envolve ou em que ele é envolvido. Nesta que acompanhei aqui, não vi vencedores nem vencidos. O cinema é que é o grande vencedor. Bola pra frente, pessoal inteligente!
Abraços

Lisandro disse...

Tudo que Herondes Cesar, fundador do Cineclube Antonio das Mortes, afirma sobre cinema, é praticamente absoluto. Ele é nosso mestre e grande pensador do cinema. Herondes é tudo de bom para todos nós.

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